Uma vacina universal contra a gripe? Investigadores fazem progressos importantes - TVI

Uma vacina universal contra a gripe? Investigadores fazem progressos importantes

  • CNN
  • Brenda Goodman
  • 23 dez 2022, 18:00
Espirrar (Getty Images)

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O vírus Influenza continua a sua investida precoce e grave, mas há notícias de esperança para as épocas gripais do futuro.

Num avanço significativo, os investigadores afirmaram recentemente que conseguiram imunizar animais contra as 20 estirpes conhecidas do vírus Influenza A e B, o que assinala um passo importante rumo ao objetivo de criar uma vacina única contra todos os tipos de gripe.

As vacinas atuais da gripe preparam o corpo para o proteger de quatro estirpes: duas de Influenza A e duas de B. A composição destas vacinas é alterada todos os anos em antecipação das estirpes que vão deixar a maioria das pessoas doentes na próxima estação.

Sabe-se que determinadas estirpes circulam entre os humanos, mas muitas mais circulam nos animais e os cientistas receiam que esses vírus possam passar para os humanos – expondo-nos subitamente a vírus que o nosso sistema imunitário nunca viu.

É aí que uma vacina universal para a gripe pode ajudar.

A ideia é que essas vacinas polivalentes possam preparar o corpo para reconhecer esses vírus, caso algum deles passe para os humanos, ajudando a prevenir a doença grave e a morte.

Há várias vacinas universais para a gripe em diversas fases de desenvolvimento e testes, incluindo uma dos Institutos Nacionais da Saúde dos EUA (NIH na sigla original).

No estudo atual, a vacina experimental foi usada apenas em ratos e furões, e os resultados foram comunicados no mês passado no jornal Science. Os investigadores dizem que estão a trabalhar no processo para que a vacina cumpra as normas de qualidade para humanos e pretendem experimentá-la em pessoas em 2023.

A esperança é que, se os testes tiverem sucesso, a vacina possa vir a proteger as pessoas na eventualidade de surgir outra estirpe de gripe pandémica.

Uma outra aplicação para a tecnologia mRNA

Para criarem a vacina, os investigadores contaram com a mesma tecnologia mRNA usada nas vacinas da covid-19.

Mas os cientistas começaram estas experiências em 2017, anos antes de serem administradas as primeiras vacinas contra a covid-19. Na verdade, foi essa investigação que ajudou a criar as bases para as vacinas da covid-19.

Na procura por uma vacina universal contra a gripe, os cientistas têm estudado cuidadosamente os vírus da gripe, em busca de regiões estruturais que sejam semelhantes nas várias estirpes.

A ideia é que, se encontrarem uma ou duas regiões que não mudem muito de estirpe para estirpe, podem treinar o sistema imunitário para criar anticorpos contra essas regiões e proteger as pessoas de diversos vírus ao mesmo tempo.

Esta abordagem tem revelado ser complicada, segundo Jennifer Nayak, especialista em doenças infeciosas pediátricas que estuda as respostas imunitárias ao vírus Influenza no Centro médico da Universidade de Rochester, em Nova Iorque. Ela não participou na nova pesquisa.

Entre as 20 estirpes conhecidas de gripe, “há regiões que todas têm em comum, mas são poucas e espaçadas”, disse Nayak.

Estas regiões não são aquilo a que se chamaria imunodominantes, segundo Nayak. Por vezes, o sistema imunitário acaba por reagir àquilo que difere entre os vírus, não àquilo que é comum.

A equipa que está a trabalhar na nova vacina, liderada por investigadores do Instituto de Imunologia da Universidade da Pensilvânia, tentou algo diferente. A vacina inclui instruções genéticas para criar a proteína hemaglutinina, ou HA, de cada uma das 20 estirpes.

“Em vez de tentarmos encontrar algo comum, vamos colocar todas as 20 proteínas HA – vamos colocar os mRNA de todas elas nesta vacina”, disse Nayak.

Prova de conceito

A hemaglutinina é uma proteína que sai da superfície dos vírus da gripe, tal como a proteína de pico do vírus SARS-CoV-2, segundo Scott Hensley, autor principal do novo estudo e microbiólogo no Instituto de Imunologia da Pensilvânia.

As proteínas HA parecem-se um pouco com fósforos espetados numa maçã, com uma cabeça em globo no topo de um caule comprido.

“O que verificámos foi que estas vacinas provocam a produção de níveis elevados de anticorpos contra os 20 subtipos. E descobrimos que os anticorpos reagem tanto à cabeça em globo no topo da HA como ao caule da hemaglutinina, que está um pouco mais abaixo”, disse Hensley.

Mas antes de os investigadores testarem isso, vacinaram grupos de ratos com todos os antigénios que queriam incluir na vacina para terem a certeza de que, individualmente, cada um deles criava uma resposta imunitária.

Então, usaram essas instruções genéticas e combinaram-nas numa única vacina. Cada estirpe foi incluída numa dose de 2,5 microgramas. No total, a vacina incluiu uma dose de 50 microgramas de mRNA.

Os investigadores testaram a vacina em animais que nunca tinham sido expostos ao vírus Influenza e em animais que tinham anteriormente sido infetados com vírus da gripe H1N1, semelhantes ou diferentes dos que foram incluídos na vacina. Isto foi propositado para mostrar se a vacina potenciava seletivamente anticorpos para estirpes de gripe que os ratos tinham nas suas memórias imunitárias, um fenómeno chamado imprinting.

A vacina aumentou os anticorpos de estirpes da gripe a que os ratos tinham sido expostos antes, segundo os cientistas, mas para isso não foi preciso gerar novos anticorpos para proteínas virais que eram desconhecidas dos sistemas imunitários dos animais.

Os cientistas também puseram os ratos à prova com estirpes de gripe que eram muito semelhantes às que estavam incluídas na vacina, e com aquelas que eram menos semelhantes. Os ratos produziram anticorpos que se ligaram aos dois tipos de gripe, mas esses anticorpos neutralizaram apenas o vírus mais semelhante.

Os ratos que foram confrontados com o vírus menos semelhante adoeceram, mas começaram a recuperar sete ou oito dias após a infeção.

Os ratos que tinham recebido uma vacina placebo, que incluía instruções de mRNA para criar uma enzima não relacionada, morreram após exposição à gripe.

À procura de proteção contra pandemias futuras

“Espera-se que a nossa vacina induza uma espécie de nível base de imunidade que previna infeções graves, mortes e hospitalizações”, disse Hensley. Não impede forçosamente que as pessoas adoeçam com gripe.

Cientistas que não participaram no trabalho elogiaram a ideia, mas preveniram que os resultados têm de ser repetidos em humanos.

“Creio que é uma prova de conceito científico, é muito inovador e realmente intrigante”, disse Kathy Neuzil, diretora do Centro de Desenvolvimento de Vacinas e Saúde Global da Faculdade de Medicina da Universidade do Maryland.

“São apenas ratos e furões. Os humanos são obviamente seres muito mais complexos a nível genético e imunológico.”

Acrescentou ainda que está por saber como uma vacina assim seria melhor utilizada. Se funcionar tão bem nos adultos como nos ratos, precisaria de um reforço todos os anos? Ou seria melhor usá-la em crianças para criar uma imunidade de base que pudessem manter durante anos?

Neuzil disse que está cética em relação a isso.

“É certamente pouco provável que dure. A durabilidade das vacinas de mRNA não demonstrou com a Covid, por exemplo, ser significativamente mais longa do que outras vacinas”, disse.

“Portanto, creio que esta vacina seria utilizada mais de maneira limitada e talvez mais temporária relativamente ao momento em que a proteção é necessária.”

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