Uma sogra tóxica acabou com o meu casamento: «Chamava-me bruxinha» - V+ TVI1224
foto: freepick

Uma sogra tóxica acabou com o meu casamento: «Chamava-me bruxinha»

  • Redação V+ TVI
  • 7 out, 09:45

O que começou com gestos de carinho tornou-se num pesadelo.

Todas as semanas, publicamos um conto ficcional sobre o amor, a partir de um caso real  

Chamo-me Inês, tenho quarenta anos certos, e posso dizer sem hesitar que os últimos oito foram um inferno. No início, parecia tudo normal. A minha sogra, Maria João, era uma mulher de cinquenta e muitos anos, recém-reformada, viúva, com bom aspeto e dona de uma energia que, na altura, me pareceu até simpática. Era mãe de dois filhos — o meu marido, Jaime, e a irmã dele, que vivia em Londres.

Sempre fui uma pessoa sensível às energias. Desde nova, sinto quando um ambiente está pesado ou quando uma pessoa traz algo escondido dentro de si. Acredito que tudo vibra, que há presenças e intenções que se sentem antes de se verem. Às vezes, faço pequenos rituais de purificação — acendo incenso, deixo sal grosso nas janelas, ou simplesmente abro as cortinas para deixar o sol entrar e limpar o ar.

Quando conheci a Maria João, senti um arrepio. Não era hostilidade, era… uma vibração densa, uma sombra sob o sorriso. Ignorei. Achei que era só impressão.

Tudo começou devagar. A minha sogra aparecia lá em casa com uma sopa “feita com amor”, com bacalhau à Gomes de Sá “porque o Jaime sempre adorou”. Achei simpático. Um pouco exagerado, talvez, mas bem-intencionado. Só que aquilo foi-se intensificando. Passou a vir todos os dias — era intrusivo.

Quando o Manel nasceu, o inferno instalou-se de vez. Aparecia ao fim do dia para dar o banho, trazia roupas que eu não tinha escolhido, contrariava tudo o que eu queria. Se eu dizia que o bebé dormia melhor sem música, ela punha uma canção de embalar. Se eu queria dar o peito, ela aparecia com um biberão “só para o caso”.

Tentei falar com o Jaime. Disse-lhe que aquilo estava a passar dos limites. Ele conversou com ela — e foi o suficiente para ela explodir. Chamou-me egoísta e mal-agradecida.

Foi aí que revelou outra faceta, uma que eu até então não conhecia. A mulher doce, atenciosa, que aparecia com bolos e sorrisos, transformou-se. Tornou-se fria, calculista, ferida no orgulho. Começou a fazer comentários passivo-agressivos, sempre com aquele tom de falsa gentileza.

“Há mulheres que não sabem cuidar de um bebé, coitadas”, dizia ela enquanto me olhava de lado.
Ou então: “No meu tempo não havia estas modernices… e os filhos cresceram bem.”

O Jaime não via — ou não queria ver. À frente dele, ela voltava a ser a mãe exemplar, vulnerável, sozinha. Mas comigo, quando ficávamos a sós, deixava cair a máscara. O olhar dela mudava. Havia desprezo. Havia raiva.

A casa começou a pesar. As noites pareciam mais frias, o ar mais denso. Às vezes, acendia um pau de incenso e abria as janelas para limpar a energia. Ela um dia apanhou-me a fazê-lo e riu-se com desdém:
— Lá está a Inês com as suas bruxarias outra vez.

E desde então, passou a chamar-me “a bruxinha”. Dizia isso à frente do Jaime, a rir, mas havia veneno por trás das palavras.

Pouco tempo depois, começou a dizer que não se sentia bem, que estava doente. Possivelmente com algo grave — falava de cancro, de “algo no sangue”. Queixava-se de tudo: dores difusas, cansaço, falta de ar. Fez uma bateria de exames, mas nada aparecia. Mesmo assim, o Jaime passou a viver praticamente em função das consultas e exames que ela fazia no hospital.

Eu queixava-me de ficar com tudo sozinha — a casa, o bebé, o trabalho. Quando ela ouviu, fez-se ainda mais de vítima. Dizia que não podia estar sozinha, que se sentia pior quando o filho não estava por perto, e que o único remédio era ter o Jaime e o Manel junto dela.

E lá ia ele, todos os dias, com o Manel nos braços, como se aquele ritual fosse indispensável para a saúde da mãe.

As nossas discussões começaram a aumentar.
— Mas queres que a deixe sozinha, Inês? — perguntava-me ele, já impaciente. — Ela não tem ninguém.

Calei-me. Esperei que passasse. Tentei convencer-me de que era apenas uma fase, que quando ela melhorasse tudo voltaria ao normal.
Mas piorou.

Numa das idas ao hospital, ela caiu e partiu um pé. Cancelámos as férias — “porque ela não podia estar sozinha”, dizia o Jaime. Eu sugeri contratarmos alguém para ajudar, mas ela recusou tudo. Dizia que não confiava em estranhos, que só o filho sabia tratá-la como merecia.

Pouco tempo depois, acabou por se mudar para nossa casa. No início, foi “temporário”, apenas até recuperar da fratura. Mas o temporário virou rotina, e a rotina virou posse.

De repente, ela estava em todo o lado. Na cozinha, a dar ordens; na sala, a criticar; no quarto do Manel, a refazer o que eu tinha feito. Eu já não tinha espaço nem voz.

E foi aí que percebi — ela não estava apenas a precisar de ajuda. Ela estava a conquistar território.

A casa deixou de ser minha. O cheiro mudou. As minhas coisas desapareceram lentamente das prateleiras, substituídas por frascos dela, fotografias antigas, toalhas com o bordado “MJ”. No início, eram apenas detalhes, mas a cada semana ela ocupava mais espaço — o físico e o emocional.

Comecei a acordar tensa. Andava de pontas dos pés, com medo de qualquer comentário. Ela estava sempre à espreita, sempre pronta a corrigir, a julgar. Se eu me atrasava cinco minutos para ir buscar o Manel, ouvia:
— No meu tempo, uma mãe não punha o trabalho à frente do filho.
Se o jantar saía tarde, dizia com um suspiro:
— O Jaime sempre gostou de comer cedo, coitado.

E ele… sorria. Achava que era apenas preocupação de mãe.

A distância entre nós foi crescendo. O toque dele desapareceu. As conversas também. O que antes era cumplicidade transformou-se em silêncio. Um silêncio espesso, cortante. Quando tentava falar, o Jaime cansava-se:
— Inês, estás sempre a implicar. A minha mãe está doente.

Mas ela não estava doente. Estava a manipular cada pedaço da nossa vida. E a energia da casa — pesada, densa, quase sufocante — parecia confirmar isso todos os dias.

O Manel começou a crescer no meio desse ambiente tenso. Via-me chorar às escondidas e perguntava:
— Mãe, estás triste com a avó?
Eu respondia que não, que estava só cansada. Mas ele via. As crianças veem sempre.

A Maria João fazia-se de mártir. Dizia ao Jaime que eu a ignorava, que era fria, que não a respeitava. E ele acreditava. Um dia ouvi, sem querer, uma conversa deles na cozinha.
Ela dizia:
— Eu sei que ela não gosta de mim, filho. Eu sinto. Mas tudo bem. Eu só quero estar perto de vocês.
E ele respondeu:
— Não digas isso, mãe. Ela é só um pouco… impaciente.

Naquela noite, chorei em silêncio. Já não reconhecia o homem ao meu lado.

Os meses passaram. As discussões tornaram-se rotina. Eu sentia-me encurralada, desvalorizada, vazia. Tentava recuperar o equilíbrio, mas ela parecia sempre dois passos à frente. Sabia o que dizer, quando dizer, e a quem. Comecei a ser a “má da história”.

Um dia, encontrei o Jaime e o Manel sentados no sofá, a ver um álbum antigo de fotografias que ela trouxera do sótão.
— Olha, este era o teu pai pequenino, dizia ela, emocionada. — Tão querido, tão parecido contigo.

E o Jaime olhava para ela com ternura, com aquela devoção que antes era minha.
Senti-me invisível.

Tentei reagir. Falei com uma amiga, contei-lhe tudo. Ela foi direta:
— Inês, ela está a competir contigo.
E eu respondi, amarga:
— Eu sei. E está a ganhar.

A partir daí, comecei a guardar distância. Trabalhava mais horas, ficava fora sempre que podia. Qualquer coisa era melhor do que voltar para aquela casa contaminada. Mas, quando chegava, via o Manel no colo da avó, e o Jaime a rir-se ao lado. E sentia-me a intrusa.

Um domingo à tarde, enquanto eles dormiam a sesta, sentei-me na varanda com uma mala pequena. Lá dentro, um caderno, o telemóvel, uns documentos e uma fotografia do Manel bebé. Senti que aquele podia ser o dia em que eu ia embora. Mas não consegui. Ainda não.

Continuei a viver naquela espécie de guerra fria. O amor esvaiu-se de vez. Já não havia abraços, nem planos, nem futuro. Só a rotina. Só o peso.

Um dia, o Jaime chegou a casa e disse, sem olhar para mim:
— A mãe não se sente bem. Disse que não consegue respirar sozinha. Vai dormir no nosso quarto hoje, para eu ficar de olho nela.

Fiquei parada. Olhei para ele, para o homem que um dia prometeu proteger-me. E percebi, finalmente, que eu já não existia ali.

Nessa noite, não dormi. Levantei-me devagar, peguei na mala que nunca tinha desfeito e saí. O silêncio era profundo, quase sagrado. Não deixei bilhete. Não olhei para trás.

Fui para a casa da minha irmã. Chorei durante dias. Depois, devagarinho, comecei a respirar outra vez.

O divórcio foi um processo frio, quase burocrático. O Jaime parecia anestesiado. Disse apenas:
— Nunca pensei que fosses capaz de desistir.
E eu respondi:
— Eu não desisti, Jaime. Eu sobrevivi.

Hoje, passados dois anos, ainda me dói. Ainda me custa ver o Manel falar da avó com aquele brilho no olhar. Mas aprendi a aceitar. Há pessoas que não sabem amar sem possuir. E há amores — mesmo os de mãe — que são veneno disfarçado de cuidado.

A Maria João continua viva, com saúde, com o seu filho ao lado. Eu sigo a minha vida, devagar, reconstruindo o que restou de mim.

Não a odeio.
Mas nunca mais deixei ninguém entrar na minha casa sem pedir licença.
E, de vez em quando, acendo o meu incenso, abro as janelas e deixo o ar novo entrar.
Só assim consigo garantir que a energia que fica… é só minha.

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