Karren Lovejoy passou anos a sentir-se incompreendida e confusa sobre o seu próprio corpo. O que ela pensava ser um problema exclusivamente seu, viria mais tarde a ter um nome: vaginismo. Foi através de um programa de televisão que finalmente encontrou uma explicação para aquilo que sentia — e que muitas mulheres continuam a viver em silêncio.
“Não era uma escolha. Eu simplesmente não conseguia.”
O desabafo sincero de Karren no TikTok tornou-se viral e está a ajudar a quebrar o silêncio em torno do vaginismo, uma condição que dificulta ou impede a penetração vaginal, muitas vezes devido a dor intensa e contrações involuntárias dos músculos pélvicos.
“Fui virgem até casar, e não porque estava a guardar-me por convicção. Simplesmente não conseguia.”
Aos 13 anos, percebeu pela primeira vez que algo não estava bem, quando tentou colocar um tampão e sentiu como se houvesse uma parede a bloquear a entrada. O mesmo aconteceu anos mais tarde, na sua primeira tentativa de ter relações sexuais.
“Parecia que era algo fácil para toda a gente, mas não para mim. Sentia-me quebrada.”
Após uma segunda tentativa frustrante e dolorosa, percebeu que aquilo não ia desaparecer sozinho. Foi então que viu a série Sex Education, onde uma personagem falava sobre vaginismo. Pela primeira vez, o que sentia tinha um nome.
“Fui ao ginecologista e disse: ‘Acho que nem tenho buraco’. A médica respondeu: ‘Tens, sim. Só é muito pequeno. E tens vaginismo. Vais precisar de fisioterapia do pavimento pélvico.’”
A jornada da cura
Antes mesmo do diagnóstico oficial, Karren tinha pesquisado no Reddit e encontrado uma comunidade de mulheres com experiências semelhantes. Mas na sua vida pessoal, ninguém sabia o que era: nem a mãe, nem os amigos.
A fisioterapia começou com sessões mais emocionais do que físicas: exercícios de respiração, alongamentos e reconexão com o corpo.
“Pela primeira vez percebi que nunca me senti realmente ligada ao meu corpo.”
Mas a pandemia de COVID-19 dificultou o processo. As sessões passaram a ser por videoconferência e, sozinha no quarto, Karren voltou a sentir medo.
“A ideia da penetração ainda me aterrorizava. Queria, mas ao mesmo tempo parecia invasiva e assustadora.”
Inspirada por histórias online, comprou um conjunto de dilatadores vaginais — mas demorou um ano até se sentir pronta para os usar.
O amor como apoio
Foi o apoio do futuro marido que a fez avançar.
“Quando percebi que a relação era séria, contei-lhe. Ele respondeu: ‘O que precisamos de fazer para resolver isso?’”
Começaram a agendar “sessões de dilatadores” enquanto ela ainda estava na universidade. Ele ligava-lhe por telefone, punha música relaxante e dava-lhe apoio emocional.
“Chorava antes de cada sessão, mas saber que ele estava ali ajudava imenso.”
O primeiro sucesso com um dilatador foi um marco.
“Percebi: afinal é possível.”
Mesmo assim, a jornada não foi fácil. Noite de núpcias?
“Gritei como se me estivessem a matar. Mas não estava sozinha.”
A relação sexual ainda causava dor — o corpo de Karren associava o ato ao sofrimento — mas, com o tempo, a confiança, paciência e cuidado do parceiro ajudaram a desconstruir esse medo.
“A gentileza e a compreensão dele ajudaram-me a baixar as defesas. Começou a melhorar, pouco a pouco.”
Hoje, intimidade tem outro significado para Karren.
“Sinto-me empoderada. Posso finalmente viver a sexualidade como sempre ouvi descrever.”
Falar é o primeiro passo
Karren hesitou antes de partilhar a sua história no TikTok, mas o impacto foi imediato: recebeu dezenas de mensagens de outras mulheres que se sentiam sozinhas, estranhas ou ‘partidas’.
“Quando um problema tem nome, torna-se mais fácil pedir ajuda.”
Karren lembra que há outras condições que podem causar sintomas semelhantes, como vulvodínia ou hímen imperfurado, e reforça a importância de procurar diagnóstico médico em vez de assumir conclusões.
Critica também a falta de preparação de alguns profissionais de saúde:
“Alguns ginecologistas perceberam logo. Outros foram frios e distantes, como se eu tivesse de me conformar.”
Uma nova relação com o corpo
Hoje, Karren sente que tem controlo sobre o seu corpo e sobre a sua vida.
“A minha autoestima e autonomia melhoraram muito. Agora sei que sou capaz de ultrapassar desafios, defender-me e expressar o que preciso.”
Para quem está no início do caminho, deixa uma mensagem simples, mas poderosa:
“Nunca pensei que fosse conseguir usar um tampão, quanto mais ter relações sexuais. Mas é possível.”
Em janeiro de 2018, este tema sobre o corpo feminino foi abordado no Você na TV, pela Dra. Sílvia Roque, que explicou exatamente o que é o vaginismo e o impacto que pode ter na vida das mulheres.