Sair da crise: gastar menos ou trabalhar mais - TVI

Sair da crise: gastar menos ou trabalhar mais

João César das Neves

João César das Neves desfaz o mito da decadência nacional. Portugal é um país de sucesso e os portugueses vivem bem melhor do que há uns anos

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A crise não é o fim do mundo e Portugal não vai cair em desgraça por ter pedido ajuda ao FMI. Esta abordagem que põe o pessimismo a léguas é uma das mensagens do economista João César das Neves no seu novo livro «As 10 questões da crise».

Sabia que Portugal já foi à falência sete vezes? E que tem a quinta falência externa mais antiga da História (o nosso país começou a emitir dívida em 1500 e a Casa da Índia faliu duas vezes, em 1560 e 1605, porque antes de chegar a Lisboa, «a pimenta já estava gasta»)? No século XIX, em 23 anos, falimos cinco vezes, o que nos coloca nas piores posições do Mundo, só à frente de Espanha, que teve seis em 44 anos.

Está provado que a tendência para «esbanjar recursos» é coisa real na economia portuguesa. Um padrão que temos repetido desde 1974 e que nos envolveu nos problemas em que agora nos encontramos. «Mas a crise não é um sinal de subdesenvolvimento nem uma maleita nacional, porque sucede a todos os países. É a lei da vida».

Portugal é um sucesso

César das Neves lembra que Portugal está longe de ser um país digno de pena e que nem tudo vai tão mal como parece. «Somos um país rico, com um nível de vida médio sete vezes superior ao que tínhamos em 1950, duas vezes mais alto que em 1974 e 80% superior ao nível em que entrámos na UE em 1986», refere.

Afastado o que chama de «mito da decadência nacional», sublinha que «Portugal é um grande sucesso internacional, somos o país com as fronteiras mais estáveis do planeta, a nação que melhor conseguiu manter a sua independência e conseguimos um crescimento espantoso na 2ª metade do século XX».

«Na nossa maneira trapalhona, improvisada, desenrascada, Portugal tem sido um sucesso notável de desenvolvimento, registando, no produto por habitante em paridade do poder de compra, a 8ª taxa de crescimento mais elevado do mundo na média de 1960 a 2001».

Nos últimos 20 anos deste período, tivemos a taxa de desemprego mais baixa da Europa do Sul e a 3ª mais baixa da UE. E Portugal é a única economia mundial onde um plano de estabilização do FMI correu bem. Duas vezes. Em 1978 e 1983. Em ambos os casos a austeridade funcionou rapidamente, resolvendo o equilíbrio em menos de três anos.

De quem é a culpa? E o que é que isso interessa agora?

«As crises são normais, frequentes e não são o fim do mundo. O que há a fazer é deixar de desculpas e deitar mãos à obra», conclui.

Reconhecendo que a crise tem vários culpados e que a justiça e os tribunais deviam puni-los, o professor admite também que «é muito estúpido, quando a casa está a arder (...) começar discussões necessariamente longas. Há um tempo para tudo e este não é o tempo de recriminações. Até porque a culpa última é de todos nós, que cá vivemos estes anos e elegemos os responsáveis».

Por mais que se queira apontar dedos aos políticos, diz, a culpa é da ilusão nacional. «Como é possível que uma população praticamente igual à de há 15 anos gaste 60% mais do Estado e diga que não consegue viver com menos? Não é o fim do mundo viver só com o que vivíamos há 10 anos. E não há volta a dar: precisamos de descer o nível de vida, quer queiramos quer não. Se descermos depressa será melhor. Se os ricos descerem mais do que os pobres, todos sofremos menos. Claro que há outras formas de compensar o desvio. Em vez de gastarmos menos podemos sempre trabalhar mais», ironiza.
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