Benfica-Campomaiorense, 2-0 (crónica) - TVI

Benfica-Campomaiorense, 2-0 (crónica)

Meia hora para varrer os fantasmas A expulsão perdoada a Rojas, logo aos 6 minutos, mergulhou o Benfica num mar de incertezas. Foi preciso ir buscar o ouro ao banco: só as entradas de Carlitos e João Tomás conseguiram resolver a falta de confiança dos «encarnados». Depois, com Dani a mexer os cordelinhos, aquele pesadelo sonolento deu lugar a uma onda de sorrisos.

A vitória do Benfica sobre o Campomaiorense, esta tarde, na Luz (2-0), é um bom exercício para distinguir optimistas e pessimistas. Não estando em discussão a justiça do desfecho, a exibição dos «encarnados» foi tão contrastante nos seus extremos de decepção (quase toda a primeira parte) e encorajamento (na última meia hora) que deixa em aberto interpretações para todos os gostos. 

Quem quiser pegar pelo lado positivo, terá de fazer um «forward» de 56 minutos, que o conduza às substituições introduzidas por José Mourinho. Carlitos e João Tomás - os dois estiveram ao mesmo nível de importância, embora para a história fiquem, em primeiro lugar, os dois golos do ponta-de-lança) - saltaram do banco e transfiguraram o jogo, à custa de velocidade, determinação e, principalmente, autoconfiança. 

Aquele susto de Laelson... 

Foi essa a característica que mais faltou ao Benfica até esse momento. E será interessante especular até que ponto um lance, ocorrido logo aos 6 minutos, terá contribuído para esse estado de coisas: os encarnados tentavam instalar-se no comando das operações, acabavam de ganhar o primeiro canto quando um contra-ataque de Laelson apanhou a defesa desprevenida. Rojas, o último homem, tentou tudo para travar o brasileiro, acabando por derrubá-lo à entrada da área, em lance claro de expulsão. O árbitro tingiu a falta de amarelo, mas não impediu que o Benfica mergulhasse muito cedo num mar de incertezas. 

A ousadia inicial do Campomaiorense, que apostava num claro 4x3x3, com Laelson e Jorginho como flanqueadores e Ristic na frente de ataque, causou alguns amargos de boca aos encarnados. Com o desafio de melhorar a circulação de bola lançado pelo próprio técnico durante a semana - e daí um onze inicial declaradamente ofensivo, com cinco homens vocacionados para o ataque - o Benfica dispensava bem a pressão intensa a que estava a ser submetido, que o obrigava a pensar depressa e a aumentar o grau de risco dos passes. 

Assim, viveram-se 30 minutos de incertezas, interrompidas por alguns fogachos de Poborsky e Sabry (demasiado inconstantes) e pela lucidez de Dani, o primeiro a adaptar-se às realidades e a apontar os caminhos correctos para a saída da angústia. 

Aos 29 minutos, um lance em que Sabry foi claramente derrubado na área trouxe o segundo erro grave de Francisco Ferreira e espicaçou o Benfica, incitado por um público sedento de confirmar no campo o início de uma nova era. Até ao intervalo, apesar de Jorginho e Laelson deixarem sempre um rasto ameaçador de cada vez que embalavam em velocidade, o Benfica aumentou a pressão e passou a estar mais perto da baliza de Paulo Sérgio, embora não dispondo de muitas ocasiões de golo. 

O «vai ou racha» de Mourinho 

O encontro ameaçava cair no adormecimento total. O Campomaiorense tinha perdido alguma da agressividade inicial, mas deixara no adversário a dose necessária de inquietações para lhe limitar os movimentos. José Mourinho esperou dez minutos por um sinal de mudança, que não chegou, e decidiu arriscar com a dupla substituição já referida, tendo a certeza de que para uma equipa em crise de confiança, os últimos minutos ameaçavam tornar-se ainda mais penosos. 

Carlitos não demorou mais do que dois minutos a tranquilizar o técnico, acendendo os ânimos no público e na equipa. E João Tomás, mais discreto de início, começou a cavar espaços, beneficiando também do esforço generoso mas ineficaz de Van Hooijdonk, para aparecer algumas vezes livre de marcação. 

Após quinze minutos em que o Campomaiorense se viu obrigado a aumentar o ritmo de faltas a meio-campo (o que determinou a expulsão de Poejo, amarelado por duas vezes em oito minutos), o trabalho de desgaste estava feito. A entrada de Calado (aos 68 minutos, por troca com um defesa), saudada com tremenda ovação, aumentava os níveis de entusiasmo do público. O jogo parecia enfim maduro para um golo, que já só podia acontecer na baliza alentejana. 

Foi o que sucedeu aos 76 minutos, com João Tomás a cabecear vitoriosamente um dos muitos cantos que, até à sua entrada, foram sendo resolvidos sem problemas pela defesa visitante. Os efeitos da injecção de ânimo foram tão evidente, que a partir daí se tornou claro que nada de mau poderia já suceder ao Benfica. 

E com o medo deitado para trás das costas, os encarnados embalaram enfim para quinze minutos convincentes, coroados com um golo festivo e espectacular, que mais acentuou o estado de graça de João Tomás. O Benfica chegava ao fim com um sorriso nos lábios, como quem reencontra no jogo algum motivo de alegria. E a chuva de aplausos que acolheu o último apito de Francisco Ferreira disse que esse sentimento também se estendeu ao público.  

Que uma vitória tão sofrida, diante de uma das equipas mais acessíveis da I Liga, seja acolhida desta maneira, demonstra claramente até que ponto estava instalada a crise de confiança na Luz. E deixa a pergunta no ar, pelo menos até ao próximo fim-de-semana: será que a última meia hora de jogo foi suficiente para varrer de vez todos os fantasmas?

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