Colômbia: uma fuga e 20 poemas de amor perdidos na selva - TVI

Colômbia: uma fuga e 20 poemas de amor perdidos na selva

Óscar Túlio Lizcano depois de ser libertado

Óscar Lizcano, refém das FARC durante mais de oito anos, inventou, na solidão, uma amizade com três paus

O exército colombiano havia localizado há cinco meses o local onde as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) mantinham sequestrado o ex-congressista colombiano Óscar Túlio Lizcano. Terá sido a pressão dos militares que levou um dos guerrilheiros a auxiliar a fuga do mais antigo prisioneiro político do grupo armado. Nove guerrilheiros acabaram detidos. Lizcano está no hospital a tentar recuperar os anos perdidos e a saúde de que a selva o privou. A história da sua fuga é surpreendente.

Após mais de oito anos de sequestro, Lizcano fez uma primeira comunicação pública na base aérea Marco Fidel Suárez de Cali, em que começou por pedir compreensão pela sua «incoerência por falta do uso da palavra». «Não podia comunicar ou falar com nenhum dos guerrilheiros», disse o antigo congressista, agradecendo o empenho na sua libertação e na do seu filho Juan Carlos, que há três anos também fora raptado pelas FARC e posteriormente libertado, numa operação militar.

Fintar a loucura

Horas depois, um outro filho seu, Maurício, com quem se reencontrou na Clínica Valle de Lili, em Cali, contava os efeitos do isolamento a que o seu pai estivera sujeito durante quase uma década. «A determinado momento pensou que estava a ficar louco e agarrou em três paus aos quais deu nomes e lhe dava aulas para não perder a inteligência, porque pensava que por não falar com ninguém estava a esquecer-se de como se fala e estava a sentir-se louco», disse à rádio colombiana Caracol.

Na mente de Óscar Lizcano a fuga era uma constante e a liberdade uma esperança que alimentou com pouco mais do que a companhia dos seus alunos imaginários e livros. No aeroporto, ao lado do ministro da Defesa do seu país, citou um dos autores clássicos gregos. «Disse ao ministro algo que li de Homero: a vida está acima de qualquer riqueza». E foi por isso que tentou recuperar a sua. E conseguiu-o com a ajuda de um dos guerrilheiros. Já havia tentado fazer o mesmo com auxílio de um outro, mas, segundo Maurício, a esse homem «descobriram-no e fuzilaram-no».

Saúde débil

Já «Isaza», o ex-elemento da FARC de 28 anos que o guardava, conseguiu retirá-lo da selva. Mas não sem que esta lhes impusesse uma última provação de três dias, antes de se encontrarem com militares da Brigada XIV do Exército colombiano, no final de uma peregrinação «no meio de uma dura, dura selva». Lizcano voltou para a família. Ao ex-guerrilheiro foi dada a garantia de exílio em França e a promessa de uma recompensa por parte do Estado colombiano.



Após a recepção em Cali, os médicos da Clínica Valle de Lili confirmaram o que era visível no semblante carregado de Lizcano: ele tinha deixado a selva, a selva não o tinha deixado a ele. «Disseram-nos que tem leptospirose, anemia e outros problemas no rim», explicou o seu filho. «Realizaram-se exames que confirmaram desnutrição, anemia e infecções parasitárias. Além do tratamento para estas patologias iniciou-se um tratamento psiquiátrico para ele e para a sua família», lia-se num comunicado clínico oficial.

Já com a sua família, o antigo congressista lamentou apenas que tenham ficado na selva centenas de reféns, nas mãos das FARC, e as mensagens de amor que escrevera para a sua esposa, Marta, cuja memória, diz, o manteve vivo. «Dói-me porque ficaram para trás as últimas 20 poesias que lhe tinha escrito», confessou o Óscar Lizcano.

Veja as primeiras declarações de Óscar Lizcano:

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