Serial killer: «Insensível ao sofrimento» - TVI

Serial killer: «Insensível ao sofrimento»

Tribunal da Figueira da Foz (Paulo Novais/Lusa)

Psicóloga que avaliou ex-cabo da GNR diz que se trata de uma pessoa fria e acrescenta que não se espantaria se tivesse cometido os crimes para que a sua imagem imaculada não fosse beliscada. Outros especialistas questionaram exame

Uma das psicólogas que elaboraram o perfil psicológico do ex-cabo da GNR, António Costa, disse esta manhã durante o julgamento que o arguido apresenta «níveis de sensibilidade muito baixos» e «não é sensível ao sofrimento humano». Além disso, acrescentou a perita, é frio e «não questiona as suas acções».

Isabel Baptista Santos, que falava na primeira sessão de julgamento, referiu que o arguido «sempre quis dar uma elevada imagem de si mesmo» pelo que não se espantaria que aquele matasse só para evitar que as jovens denunciassem algum aspecto menos abonatório do seu perfil, nomeadamente que manteve relações sexuais com uma delas e que as aliciou sexualmente.

«Eu nunca fiz nada de errado na vida», «toda a gente gostava da minha maneira de ser» são algumas frases que o ex-militar repetiu por diversas vezes durante as entrevistas com as psicólogas.

Isabel Santos referiu ainda que as facetas de carácter do antigo cabo, «trata-se de uma pessoa muito rígida e compulsiva», não afectam a sua plena imputabilidade.

A própria forma como se referiu às vítimas durante a perícia atesta, segundo a técnica, a grande insensibilidade. Para ele, «a X era uma desgraçada que andava com homens casados e frequentava os cafés da droga e a Y era distante e nem sequer lhe dava os bons dias».

Arguido bate o pé e abana a cabeça em discordância

Esta evocação do nome das vítimas foi, de resto, o único momento a provocar um leve burburinho na sala produzido por amigos das jovens (os pais não estão na sala, visto serem testemunhas). «Não acredito», balbuciou uma mulher , ao mesmo tempo que levava as mãos à cabeça. Refira-se que o tribunal advertiu o público para que não expresse as suas emoções, de modo a não perturbar o decurso da audiência.

O passado do arguido foi evocado quando, durante o depoimento, a psicóloga referiu que o ex-cabo assistiu ao suicídio violento do próprio pai, quando tinha nove anos.

Por diversas vezes, enquanto a técnica prestava depoimento, no banco traseiro o arguido batia compassadamente com o pé direito e abanava a cabeça, em sinal de discordância.

«Se um aluno me escrevesse isto no exame, chumbava»

Antes da psicóloga falar, já dois consultores técnicos, um professor de psicologia e um psiquiatra, indicados pelo arguido, tinham posto em causa o teste realizado.

Segundo o professor de psicologia da Universidade de Aveiro, Carlos Fernandes, alguns dos testes utilizados na perícia «não têm qualidade científica» e podem mesmo distorcer os resultados finais.

De acordo com este docente universitário, alguns exames usados «até já foram proibidos nos EUA» por apresentaram resultados errados. Carlos Fernandes exemplificou com o método usado para avaliar a maturidade sexual do arguido: «Se for relevante para este tribunal avaliar a maturidade sexual do arguido, então vão ter de decidir com base num teste inválido», defendeu.

O mesmo professor adiantou, no entanto, que a imputabilidade do arguido foi determinada com base em testes credíveis. Vários outros aspectos do relatório foram ainda criticados por Carlos Fernandes que, a dado passo, referiu: «O relatório fala em ausência de capacidade de introspecção. O que é isso? Se um aluno me escrevesse isto no exame, chumbava».

«Relatório não tem base de sustentação nenhuma»

Por seu lado, o psiquiatra Manuel Marques Pinto referiu em audiência que o relatório da perícia «não tem base de sustentação nenhuma». Este psiquiatra apontou falhas «extraordinariamente graves» à perícia efectuada.

Desde logo, o facto de não recolher mais testemunhos para além da mulher e filho do arguido, de não estabelecer o contraste entre o indivíduo e o seu ilícito criminal, bem como de não discutir os resultados finais apresentados.

Confrontada com as declarações dos técnicos, a psicóloga defendeu a total fiabilidade dos exames, referindo que alguns deles até estão adaptados à população portuguesa.
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