Chineses têm «Muralha do Ódio» na internet - TVI

Chineses têm «Muralha do Ódio» na internet

  • Portugal Diário
  • Rui Boavida para Lusa
  • 8 dez 2006, 16:22

É a última moda da Internet. Aqui os internautas deixam os seus lamentos

Israel pode ter o Muro das Lamentações, mas a resposta chinesa ao famoso monumento israelita não é a Grande Muralha - é antes a «Muralha do Ódio», a página na Internet onde os utilizadores deixam todo o tipo de queixas, escreve a Lusa.

A «Muralha do Ódio» é apenas uma das páginas num fenómeno que se tornou a última moda da Internet chinesa. Páginas onde, debaixo da capa do anonimato, os internautas libertam as pressões da vida e publicam todos os tipos de lamentos, desde dizer mal do governo e queixar-se dos pais até desabafar de raiva contra os ladrões e amaldiçoar os professores em notas mais ou menos explícitas, mais ou menos pessoais.

«Eu amo a minha namorada. Porque é que a minha mãe não me apoia? Que depressão! Quem me pode ajudar?», apela SSS, numa nota publicada na «Muralha do Ódio» (www.hatewall.com), a 24 de Setembro.

A página não é a única do tipo e outras existem que, se não resolvem problema algum, também não custam nada, ajudam o internauta chinês a descomprimir e, talvez, até mesmo a encontrar solidariedade de grupo.

Muitas das notas dirigem-se directamente a pessoas específicas, outras só podem ser entendidas por quem conheça a história pessoal do autor e algumas, se calhar, nem pelo próprio autor. Ainda assim, páginas como a «Muralha do Ódio» vão-se tornando cada vez mais populares.

«Odeio os meus chefes. Espero que eles tenham um acidente mortal quando estiverem no carro. Espero que sofram uma hemorragia cerebral», escreveu a dois de Outubro um internauta que assina (de forma algo contraditória) com o nome de Haoren, ou Boa Pessoa.

Uma vez que, como diz Guo Ling, investigador da Academia Chinesa de Ciências Sociais e autor do estudo «O Uso da Internet em Cinco Cidades Chinesas», a maioria dos chineses acede à Internet a partir do escritório, é natural que muitas das arengas, lamentos e lamúrias se relacionem com trabalho, mas outras são muito mais pessoais.

«Odeio. Odeio-me. Odeio....Não sei o que odeio», escreveu «Aopi», a 22 Novembro, enquanto, no mesmo dia, «SS» pergunta «como distinguir entre virgens verdadeiras e falsas», não sendo claro se a pergunta é retórica e trata de um queixume ou de uma busca sincera de informação.

«Que tipo nojento. Há-de chegar o dia em que os céus vão conhecer a minha severidade. Vocês, os novos, já aprenderam a fazer chantagem e extorsão. Malditos sejam. Já não está longe o dia em que hás-de entrar na cadeia», ameaçou um anónimo no dia 20 de Setembro.

Dado o tom de muitas das páginas das lamentações, o debate sobre o seu conteúdo ético e legal alarga-se cada vez mais, dentro e fora da Internet.

Dai Wei, porta-voz da Sociedade Internet da China, afirmou já à imprensa chinesa que a organização não tem autoridade nem interesse em regular os portais.

Em 2005, as autoridades chinesas fecharam mais de duas mil páginas de Internet por considerarem que o conteúdo publicado era «impróprio», e exercem um controlo e censura constates aos servidores de e-mail, blogues e motores de busca, bloqueando regularmente o site chinês da enciclopédia on-line Wikipedia e do servidor Blogspot.

Segundo Guo Ling, o típico internauta chinês é «urbano, homem, jovem, estudante, professor ou quadro de um empresa com um alto rendimento», portanto não é de admirar que as notas reflictam muitas das ansiedades da classe média em todo o mundo.
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