SC Znojmo: o único clube checo que torce por Portugal no Euro 2024 - TVI

SC Znojmo: o único clube checo que torce por Portugal no Euro 2024

  • Vítor Maia
  • Enviado especial ao Euro 2024, em Leipzig
  • 18 jun, 08:50
SC Znojmo (Foto: Rui Amorim)

Clube da terceira divisão da Chéquia tem nove portugueses, entre eles um campeão europeu de sub-19 pelo FC Porto. Rui Amorim, Diogo Bessa, João Rodrigues e Rodrigo Vilela apresentam o projeto sui generis do SC Znojmo. «Quando estamos todos juntos até nos esquecemos que estamos na Chéquia.»

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SC Znojmo, o único clube checo que vai torcer por Portugal no Euro 2024.

O emblema da cidade que faz fronteira com a Áustria milita na terceira divisão do futebol da Chéquia e tem nove portugueses no plantel. A equipa é composta por jogadores de várias nacionalidades e curiosamente só tem um jogador do país.

«O dono do SC Znojmo aprecia as características dos treinadores e jogadores portugueses. É um apreciador da nossa filosofia de jogo. E o facto de termos vários portugueses ajuda-nos a queimar etapas para colocarmos em prática um jogo mais de posse», começa por esclarecer o técnico Rui Amorim.

«O objetivo do clube é chegar à II Liga nos próximos dois anos. O novo dono adquiriu o clube em 2022 e durante dois anos lutou sempre pela manutenção. Foram épocas complicadas. Quando chegámos aqui o clube estava em décimo lugar e já distante dos lugares cimeiros. Fizemos ajustes na paragem de inverno para a segunda fase da temporada, que arrancou em março, aproximámo-nos dos primeiros lugares», acrescenta.

Perante um grupo de nacionalidades distintas, o treinador, de 47 anos, explica que a língua-mãe do SC Znojmo é o inglês. «Essa foi a língua que definimos para estarmos todos na mesma página, embora acabemos por falar às vezes em português pelo facto de termos muitos portugueses e brasileiros», justifica.

Diogo Bessa, campeão de sub-19 pelo FC Porto, está desde janeiro na Chéquia e admite que por vezes, nem parece que está a quase três mil quilómetros de casa. «Às vezes quando estamos todos junto até nos esquecemos que estamos na Chéquia», confessa ao nosso jornal.

O lateral-esquerdo tem, por fim, a estabilidade que necessitava depois de ter terminado a ligação aos dragões e de ter estado um ano sem competir.  «Fui muito feliz no FC Porto. Apesar de ter feito uma boa época na equipa B, a passagem para o futebol sénior não correu como esperava. Aconteceram situações que não me permitiram ter sucesso no passo seguinte, é algo que não depende única e exclusivamente do jogador», justifica.
 

Campeão de sub-19 pelo FC Porto, Diogo Bessa é da mesma geração de Diogo Costa e Diogo Dalot.


Com «desconhecimento» do futebol checo e do país, Diogo Bessa integrou o plantel onde já estavam Rodrigo Vilela e João Rodrigues.

«Saí da Bulgária e regressei a Portugal numa altura a minha companheira estava grávida. Descobrimos um pequeno problema durante a gravidez e decidi ficar perto dela. As condições que me ofereceram não me agradaram e como queria ficar perto da minha família, fiquei um ano parado. Não me arrependo. Acabei por vir para o SC Znojmo pelo contexto do clube», diz o avançado de 29 anos que construiu grande parte do percurso no Louletano.

«Tenho bilhetes para o jogo, mas não vou à Alemanha porque a minha mulher não aguenta estar mais dois dias sem mim»

Um clube checo com tantos estrangeiros, a maioria portugueses, foi olhado de lado. Com a desconfiança natural de quem não conhece quem chega de novo.

«As coisas foram muito complicadas no início. O clube não era muito bem visto porque não tinha jogadores checos. Até os nossos adeptos olhavam para nós de maneira diferente. Esta é uma cidade pequena e ouvíamos comentários por sermos estrangeiros», lembra.

Esta versão é corroborada por João Rodrigues, médio de 22 anos que vive a segunda experiência no estrangeiro depois de uma passagem por Chipre.

«Éramos vistos de maneira diferente até pelos nossos próprios adeptos. Znojmo é uma cidade pequena e os primeiros tempos não foram fáceis. A Chéquia é um país muito fechado e as pessoas tiveram dificuldades em aceitar uma equipa com muitos estrangeiros», sublinha.

Rodrigo Vilela fez grande parte do percurso como jogador no Louletano.



Nas dificuldades a armada lusa dá as mãos e aguenta as saudades de casa, persiste e não desiste.

«Ter muitos portugueses ajuda. O grupo é muito próximo e temos todos uma grande relação, o que ajuda a matar um pouco as saudades. Costumamos estar juntos depois dos treinos e fazemos um ‘churrasquinho’ todas as semanas», frisa João Rodrigues.

«Com o tempo ganhamos o respeito das pessoas e mudámos a opinião dos adeptos pelo futebol que jogámos. Isso por si só já uma vitória», acrescenta Rodrigo Vilela.  

De resto, Rui Amorim concorda com as opiniões dos seus jogadores. «O primeiro objetivo era dotar o clube de maior organização e rigor. Não seria, portanto, simpática a reação de quem já aqui estava. Houve desconfiança dentro e fora do clube. As pessoas são muito fechadas e a maioria não fala inglês, exceto em Praga. Mas fomos ultrapassando a barreira linguística e acabámos com a desconfiança pela nossa forma de estar e pelo nosso trabalho. Hoje somos abordados na rua com palavras de incentivo e temos o estádio bem composto. Se é equivale a um troféu? É uma boa observação. A nossa maior conquista é sabermos que as pessoas olham para nós com outros olhos», resume.

O sorteio do Euro 2024 ditou que Portugal, o país que estes emigrantes não esquecem, jogasse contra a seleção do país onde jogam, o que justificou uma «grande festa» em casa de Rui Amorim.

«Vou confidenciar que quando foi o sorteio, estávamos em Portugal por causa da pausa de inverno. Estava com a minha família a torcer para que saísse a Chéquia e quando assim foi, fizemos uma grande festa», confessa.

Por sua vez, Diogo Bessa assume que este duelo o deixa com «um carinho ainda mais especial por Portugal», seleção estão presentes os seus ex-companheiros no FC Porto, Diogo Costa e Diogo Dalot.

«Ainda trocamos umas mensagens de vez em quando, mas é normal algum afastamento, cada um seguiu o seu caminho. Sou da mesma geração do Diogo e do Dalot, jogámos juntos dos sub-15 à equipa B e continuamos a ter um carinho especial uns pelos outros. É um orgulho vê-los ao mais alto nível», diz.

Ninguém (ou quase ninguém, vá) vai querer perder pitada do jogo desta terça-feira, em Leipzig, e por isso, já há um convívio agendado.

«Só vamos para Portugal no dia seguinte e vamos assistir ao jogo todos juntos. É especial o nosso país defrontar o país onde estamos. Ainda por cima a minha namorada é checa…», atira João Rodrigues, entre risos.

«É um jogo especial contra o país onde estamos. Porém, o sentimento pelo nosso país é muito maior do que um jogo. É a nossa casa e são as nossas famílias. Isso dá uma força maior a quem está a lutar [por uma vida melhor] fora de Portugal», reforça Rodrigo Vilela.

 

Rui Amorim, de 47 anos, é o treinador da equipa mais portuguesa da Chéquia.



Rui Amorim é o único que não vai ver o duelo entre portugueses e checos em Znojmo. «Consegui comprar bilhetes para o jogo, mas não vou à Alemanha porque a minha mulher não aguenta estar mais dois dias sem mim (risos). Quem manda é ela. Viajo nesse dia para Portugal e com sorte espero ver a segunda parte», relata enquanto solta uma gargalhada.

Entre momentos difíceis e outros de felicidade, o orgulho de ser português não desaparece. «Os checos têm uma admiração enorme pelo Mourinho. Confirmei isso quando fui assistir a um jogo da Roma em Praga, no qual tive a possibilidade de privar com o Mourinho. Também é normal vermos crianças nas ruas com camisolas do Ronaldo. Para os portugueses que estão longe de casa, num país fechado, é um motivo de orgulho do nosso país e de quem eleva o nome de Portugal», concluiu o técnico que antes de emigrar contava com passagens por Salgueiros, União de Leiria, Santa Clara e Vizela, entre outros.

Para o jogo com a Chéquia, Ronaldo e companhia bem se podem inspirar em Rui Amorim, Diogo Bessa, João Rodrigues e Rodrigo Vilela e todos os outros que elevam bem alto a nossa bandeira além-fronteiras.

 

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