Aos 10 anos são velhos demais - TVI

Aos 10 anos são velhos demais

  • Portugal Diário
  • Cecília Malheiro para Lusa
  • 10 mar 2007, 12:43
Ruben e Márcio - Foto de Luís Forra para Lusa

Conheça os sonhos de dois meninos que ninguém quer adoptar

Ruben e Márcio têm 10 anos, uma idade que os põe fora das preferências de quem adopta. Vivem na Casa dos Rapazes, em Faro, uma instituição para crianças em risco, e a sua curta vida tem um sonho mais vivo: voltar a viver com os pais biológicos, escreve a Lusa.

Com a adopção praticamente fora de questão - apenas um em cada 20 candidatos quer um miúdo acima dos seis anos - estas crianças «velhas» julgam-se «condenadas» a viver na Casa dos Rapazes até ao fim da institucionalização.

Resta-lhes a esperança de voltar aos pais biológicos, aos padrastos ou aos avós.



É quase em tom de confissão, mas com um misto de orgulho pelo passado, que Ruben conta que em tempos idos batia nos colegas e na professora da escola.

Hoje, quase dois anos depois de o juiz ter decretado que ia para a Casa dos Rapazes, o menino «reguila» está mais calmo.

Diz que adora os companheiros da turma e garante que já não bate em ninguém.

«Eu não gostava da escola e a professora não gostava de mim. Nem me conseguia ensinar. . .», conta Ruben, com os olhos postos no chão.

Antes de vir para a «Casa dos Rapazes - Instituto D. Francisco Gomes», Ruben vivia em Olhão com a avó e a mãe.

Apesar de a sua vida ter mudado - admite que já aprendeu a escrever e ler - «mais ou menos» - e orgulha-se de estar na terceira classe - as perspectivas alinham pelas do resto da família: crescer, aprender a ser pescador e dedicar a vida a apanhar nas redes as sardinhas e os carapaus.

Com o fim do tempo de institucionalização à vista - «Está quase a acabar o meu tempo aqui, o juiz disse dois anos» - Ruben encara uma perspectiva mais sombria.

Caso a família biológica continue sem condições financeiras para alimentar mais uma boca, o menino pode ficar mais um período na Casa dos Rapazes.

Márcio, 10 anos

O mesmo acontece com Márcio, 10 anos.

Vem de uma família constituída pela mãe, padrasto e cinco filhos, a viver junto ao largo da feira, no centro da capital algarvia.

«Um dia estava na escola e trouxeram-me para a Casa dos Rapazes», recorda simplesmente, sem apontar razões para mudança tão inesperada.

Apesar de estar contente na instituição, que o obriga a regras como lavar os dentes todos os dias - «lá em casa era só de vez em quando» - Márcio deixa bem claro que tem saudades dos quatro irmãos, da mãe, do padrasto.

Sem entenderem bem o que os levou até às malhas de uma nova casa que lhe pode dar mais do que a família, Márcio e Ruben podem ter que ficar na Casa dos Rapazes até à maioridade, explicou à Lusa o presidente da instituição, António Barão, e a directora técnica e psicóloga, Dora Barbosa.

«Há suporte afectivo mas depois falta suporte financeiro. Muitas das vezes há negligência a nível da alimentação, escolaridade ou de higiene», refere Dora Barbosa.

O ideal é regresso à família

Segundo o responsável pela instituição - que existe há 60 anos na cidade algarvia e alberga 60 crianças e jovens - o ideal é que as famílias voltem a recolher as suas crianças.

Mas António Barão também tem consciência que tal é raro e é por essa ra zão que alguns dos jovens ficam ali até aos 18 anos.

«Mesmo atingindo a maioridade, muitos dos rapazes não sabem que rumo dar à vida e sentem-se sós e, por isso, continuam ligados à instituição, nem que seja para virem comer e lavar a roupa, embora vivam fora da Casa dos Rapazes e sigam os seus próprios horários», observa.

Pode muito bem ser o futuro de Márcio e Ruben.
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