Michel Temer: da penumbra dos bastidores para as luzes do Planalto - TVI

Michel Temer: da penumbra dos bastidores para as luzes do Planalto

  • Sofia Santana
  • 12 mai 2016, 10:48
Michel Temer [Foto: Reuters]

Com 75 anos, o político do PMDB e até agora vice-presidente, será o próximo Presidente do Brasil. Um político discreto, mas cujo nome está ligado a vários casos de corrupção, e a quem sondagens recentes não atribuem mais do que 2% das intenções de voto

É o homem que irá liderar os destinos do maior país da América Latina, agora que se confirmou a destituição de Dilma Rousseff. Michel Temer, 75 anos, do PMDB e até agora vice-presidente, será o próximo Presidente do Brasil. Um político discreto, mas cujo nome está ligado a casos de corrupção, e a quem sondagens recentes não atribuem mais do que 2% das intenções de voto.

Nascido no seio de uma família de imigrantes libaneses, que se instalou em Tieté, no estado de São Paulo, Temer, um especialista em Direito Constitucional, é tido como um político discreto e elegante, sempre com uma postura ereta e um ar muito formal.

Há mesmo quem, em pleno Congresso, lhe tenha apontado a “pose de mordomo de filme de terror”. Uma expressão que remonta a 1999, proferida pelo então presidente do Senado, António Carlos Magalhães, e que foi aproveitada pelos seus opositores. 

Estas são algumas das caraterísticas que terão contribuído para a sua falta de popularidade entre os eleitores brasileiros. Sondagens recentes indicam que, no melhor dos cenários, apenas 2% dos brasileiros votaria em Temer para Presidente do Brasil.

Um artigo do New York Times destaca mesmo que, até há bem pouco tempo, a maioria dos brasileiros conhecia-o apenas pela mulher, Marcela, uma antiga miss de concursos de beleza, de 32 anos. 

A verdade é que só recentemente o nome de Michel Temer se tornou familiar, quando o até agora vice-presidente do Brasil ganhou destaque dos media, deixando de ser apenas uma figura de bastidores.

"Profissional da política e das intrigas parlamentares"

É que foi precisamente nos bastidores da política brasileira que Temer construiu o seu percurso, depois de ter sido advogado e professor universitário nos anos da ditadura. 

Uma carreira que começou com a filiação no PMDB, em 1981, e com o cargo de Procurador-Geral do Estado, em 1983. Foi presidente da Câmara dos Deputados pela primeira vez em 1997 e ascendeu a presidente do PMDB em 2001. Em 2011, tornou-se o 24º vice-presidente do Brasil, depois da aliança entre o PMDB e o PT de Dilma, cargo para o qual voltou a ser indicado no segundo mandato da Presidente do Brasil. 

É nos bastidores que Temer se sentirá como peixe na água. A este propósito, um artigo do Folha de São Paulo descreve-o como “péssimo no palanque”, mas “desenvolto nos bastidores”.

Um texto do Le Monde vai mais longe, destacando-o como “um homem de bastidores” e um “profissional da política e das intrigas parlamentares”.

Não terá sido por acaso que o pedido de destituição da presidente do Brasil foi alvo de paródias que, nas redes sociais, compararam o processo com a série norte-americana “House of Cards”.

Até porque, para Dilma Rousseff, o impeachment foi sempre uma tentativa de "golpe" de Estado. E Temer considerado uma das principais figuras desse alegado estratagema.

O afastamento de Dilma

“Traidor", "golpista", "chefe dos conspiradores". Dilma não lhe poupou críticas quando, a 11 de abril, a imprensa divulgou um discurso que o seu número dois tinha preparado para a destituição da governante. Uma gravação que caiu mal dentro do próprio PMDB, considerada "infantil" por muitos membros do partido.

Este momento terá sido a "gota de água" na já muito azeda relação entre a presidente do Brasil e o seu vice. Os desentendimentos duravam há meses e Temer já se tinha, inclusivé, queixado de uma alegada “desconfiança” de Dilma, numa carta divulgada na imprensa. Mais, na missiva, Temer refere que Dilma o tratou como um “vice-presidente decorativo”.

Identificar os primeiros sinais de afastamento entre Dilma e Temer implica recuar até ao ano passado e a uma frase em particular: é preciso “alguém que tenha a capacidade de unir o país”. Estávamos a 6 de agosto e Temer reconhecia a gravidade da crise política e económica, apenas um mês depois de ter dito que não havia crise política nenhuma. A frase caiu como uma bomba entre os apoiantes de Dilma, que depressa insinuaram que o número dois do governo estava a conspirar contra a presidente.

A partir daí, uma sucessão de acontecimentos cimentou o afastamento entre os dois. Primeiro, o vice quis deixar de ser o articulador político do executivo no Congresso, numa decisão que foi interpretada como uma forma de aproximação aos partidos da oposição, com vista a um eventual governo.

Depois, Temer foi uma das figuras centrais do programa do PMDB que criticou o governo e incluiu frases como “é hora de virar o jogo”.

Nome ligado a casos de corrupção

Michel Temer chega à presidência do Brasil depois de o seu nome ter estado ligado a vários casos de corrupção.

A operação "Lava Jato" é um dos exemplos. O seu nome foi citado por delatores na operação, que apontaram relações entre o vice e envolvidos no esquema de corrupção da Petrobras. Temer negou envolvimento no caso e a Procuradoria-Geral da República considerou que político do PMDB foi citado de forma indireta, não havendo indícios suficientes contra ele.

Antes, já tinha sido mencionado noutros processos. Como em 2009, na operação "Castelo de Areia", onde o seu nome apareceu numa lista de beneficiados por doações de empreiteiras. O processo acabou anulado pela justiça. Temer sempre negou estas irregularidades.

Há ainda outro caso com o seu nome associado e que tem a ver com o porto de Santos, o maior porto do país. Neste processo de 2000, Temer foi citado como beneficiário de um esquema de cobrança de várias quantias de dinheiro por parte de empresas com contratos no porto. Em 2002 a Procuradoria-Geral da República decidiu arquivar o caso e, um ano depois, com a revisão do processo, as autoridades entenderam que não havia factos novos contra Temer.  

Recentemente, Michel Temer foi condenado a uma multa por aquilo que no Brasil chamam de “ficha suja”. Foi condenado pelo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo por, em 2014, ter feito doações de campanha acima do limite permitido por lei. Teve de pagar uma multa de 80 mil reais (cerca de 20 mil euros), mas a nota emitida pelo tribunal deixa claro que, após esta infração, Temer não poderá concorrer às eleições de 2018. A menos que uma nova decisão - uma vez que Temer ainda pode recorrer - determine o contrário.

Os desafios do Brasil

A possibilidade de se candidatar em 2018 já foi, de resto, descartada pelo próprio. Temer já disse que apoia a proposta do fim da reeleição no país para cargos executivos. Declarações que foram interpretadas como uma tentativa de reunir apoios do PSDB.

Uma coisa é certa: até 2018 Temer terá vários desafios pela frente para conseguir "unir o país", como ele próprio sublinhou que era necessário.

Para além dos problemas de ordem económica, o Brasil tem sido dos países mais afetados pelo vírus Zika e este ano acolhe os Jogos Olímpicos, um evento de dimensão mundial que ocorre depois de, há dois anos, o Mundial de Futebol ter gerado muita contestação e protestos por todo o território.

 

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