Como a PJ apanhou o ex-cabo - TVI

Como a PJ apanhou o ex-cabo

Julgamento do alegado serial killer (Foto Lusa/ Paulo Novais)

As «justificações por antecipação» e as «pistas equívocas» levaram os inspectores a desconfiar do antigo militar da GNR. António Costa até sabia de pormenores que não eram públicos. Pai de uma vítima chamou-lhe «monstro»

[Última actualização às 22h30]

O director nacional adjunto da PJ, Pedro do Carmo, recordou esta tarde em tribunal todos os passos dos investigadores até chegarem ao ex-cabo de Santa Comba Dão, acusado pela morte de três jovens. Num longo e detalhado depoimento, o coordenador da PJ de Coimbra começou por enunciar «elementos comuns» aos crimes.

«As três raparigas viviam a 30 metros de distância; os desaparecimentos ocorreram com intervalos de seis meses; todas desapareceram em dias da semana, perto da hora do almoço». Além disso percorreram a mesma estrada. Partindo destas premissas, os investigadores restringiram o leque de suspeitos a alguém que estivesse por perto e livre aos dias de semana.

As abundantes «justificações por antecipação» do ex-cabo saltaram à vista. Pedro do Carmo deu exemplos: numa ocasião, vendo que a PJ trabalhava na mata colada à sua casa, o arguido dirigiu-se à inspectora: «Se encontrarem partículas minhas é porque me cortei nas silvas».

Poucos dias após o cadáver da segunda vítima (Mariana) ter sido encontrado, o director nacional adjunto da PJ deslocou-se a casa do ex-cabo. A primeira pergunta do arguido deixou-o ainda mais desconfiado: «Sei que encontraram um corpo na barragem de Penacova. Será da Joana?». Ora a notícia desta descoberta tinha sido muito discreta e publicamente a PJ não a relacionara com o desaparecimento das jovens.

Também o «empenhamento do arguido em fornecer informações equívocas», designadamente referindo que o percurso feito pelas vítimas era frequentado por toxicodependentes, adensou as suspeitas de que estaria envolvido.

O facto de os corpos terem sido guardados em sacos de ráfia iguais aos encontrados em casa do ex-cabo e, uma vez mais, as justificações apressadas acabaram por trair o arguido: «Confrontado com uma mancha de sangue no seu carro disse de imediato que comprara carne» no hipermercado. Ao ficar a saber que o sangue era humano respondeu: «Cortei-me». E «se for sangue da Joana?», questionou a inspectora «Costumo deixar o carro lá fora, alguém pode ter levado».

Arguido «reconheceu os crimes»

«Perante mim o indivíduo reconheceu ter cometido os crimes», referiu Pedro do Carmo. E continuou: «Durante o interrogatório na PJ perguntei-lhe: o senhor estava doente quando cometeu os crimes? Ele respondeu-me: Sim, estava». Despediram-se com um aperto de mão. O director da PJ de Coimbra recorda a «força» invulgar desse cumprimento.



Questionado sobre se um indivíduo de estatura baixa seria capaz de matar sozinho as três raparigas, Pedro do Carmo lembrou a «força» do ex-cabo. António Costa olhou a própria mão e esboçou um sorriso irónico, que se esbateu quando o responsável da PJ concluiu o raciocínio. «É um homem com muita força. Acredito firmemente que o arguido sozinho foi capaz de cometer estes crimes».

O início do «comportamento atípico» de António Costa (em alternativa ao termo «psicopata») coincidiu com a sua reforma. Passava os dias sozinho em casa. «Ninguém começa a matar de repente. Isso vem nos manuais», explicou Pedro do Carmo.

«Este monstro» ou «senhor Costa»

Durante o dia, o tribunal ouviu ainda os pais das vítimas, que se mantiveram, em regra, calmos e fluentes nos discursos. A descrição do sofrimento em que vivem levou, no entanto, as mães a não susterem as lágrimas.

Os familiares reconstituíram os dias dos desaparecimentos e recordaram a excessiva preocupação do arguido em acompanhar de perto as investigações, ora colocando perguntas, ora fornecendo respostas inesperadas.

Fernando Oliveira, pai de Joana, exemplificou: «Um dia o arguido veio ter comigo e disse-me que tinha sido encontrado um corpo decepado na barragem». E acrescentou: «Não é a Joana. Mas a tua filha também vai aparecer».

O mesmo progenitor recordou ainda como «este monstro» ajudou os irmãos de Joana a procurá-la. O juiz fez-lhe um reparo: «Não vale a pena estarmos com isso». O pai encolheu os ombros: «Senhor Costa, pronto».
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