Caso EDP: A derradeira chance do Ministério Público para provar que Pinho era o "agente infiltrado do BES" no Governo de Sócrates - TVI

Caso EDP: A derradeira chance do Ministério Público para provar que Pinho era o "agente infiltrado do BES" no Governo de Sócrates

Manuel Pinho (Miguel A. Lopes/Lusa)

"Um caso de subordinação do poder político ao poder económico". Foi desta forma que o procurador Rui Batista descreveu o processo em que Pinho é acusado de manter um pacto corruptivo com Ricardo Salgado para favorecer o BES enquanto era ministro da Economia

Um “pacto corruptivo”, uma combinação de “crimes ponderados” e uma pena que “garanta que o crime não compensa”: “Não menos do que nove anos de prisão” para Manuel Pinho e “seis a sete anos de prisão efetiva” para Ricardo Salgado. Doze anos depois de o processo EDP começar a ser investigado, o procurador Rui Batista teve esta segunda-feira a derradeira oportunidade para demonstrar ao coletivo de juízes que o ex-ministro da Economia, a sua mulher e o antigo homem-forte do BES devem ser condenados por crimes como corrupção, branqueamento de capitais e fraude fiscal. 

Em sete meses foram ouvidas centenas de testemunhas, desde antigos altos-cargos do Grupo Espírito Santo a ex-responsáveis políticos, como Passos Coelho, Durão Barroso e José Sócrates. E foram também vistos à lupa diversos momentos em que Manuel Pinho e Ricardo Salgado, como o Ministério Público expõe, desenvolveram um plano para que a EDP atuasse em benefício do BES, “causando um prejuízo aos portugueses estimado em 1,2 mil milhões de euros”.

Logo no início do julgamento, que foi adiado por duas vezes devido a sucessivas greves dos funcionários judiciais, o procurador tentou sustentar a ideia de que Manuel Pinho “mercadejou o cargo de ministro” ao, enquanto ministro da Economia, ter tomado “decisões em função do BES e de clientes do banco”. Esta segunda-feira, a ideia que tentou passar aos juízes foi mais solene: mais do que um caso de corrupção, este “é um caso de subordinação do poder político ao poder económico”.

Já Pinho foi resoluto. À saída do tribunal disse estar “totalmente seguro” que não cometeu nenhum crime de corrupção e que todo o caso nasce do facto de ter tido um contrato laboral com o GES. “Ficou provado que atos de corrupção…zero”, disse aos jornalistas, antes de encarar uma das principais teses do Ministério Público - a de que Pinho, enquanto governante, terá recebido 15 mil euros por mês vindos do saco azul do GES para agir, segundo refere a acusação, como um “verdadeiro agente infiltrado do BES/GES no Governo da República”. “Havia uma dívida”, justificou-se, “que decorria de um contrato laboral”.

Estes pagamentos mensais de 15 mil euros - e outro de meio milhão de euros pago de uma só vez em maio de 2005 - foram executados durante 18 anos, entre 1994 e maio de 2005. Os fundos emergiam da Espírito Santo Enterprises, empresa sediada nas Ilhas Virgens Britânicas, e iam parar a uma das três offshores que Pinho fundou antes de ir para o Governo: a MASETE (as iniciais de Maria, Sebastião e Teresa, os nomes dos filhos). 

Desse total de pagamentos, Pinho recebeu 500 mil euros dois meses após tomar posse no governo de José Sócrates e continuou também a receber do saco azul do GES 15 mil euros mensais durante quatro anos. É este facto, advogou o procurador, o “mais grave do ponto de vista criminal” em todo o caso.  “A gravidade é esta: alguém que exerce funções públicas recebe dinheiro de entidades privadas”, declarou.

"Era pegar ou largar"

Esse dinheiro, admitiu o próprio Manuel Pinho logo no requerimento de abertura de instrução, não foi declarado ao fisco durante vários anos, tendo a situação só sido regularizada em julho de 2012. Tratou-se de um crime de fraude fiscal e foi o próprio advogado do ex-ministro a admiti-lo: "Não vale a pena 'dourar a pílula': o arguido cometeu, ao longo de vários anos, crimes de fraude fiscal, tendo 'embarcado' num esquema global dentro do GES, em que os pagamentos de parte das remunerações e de prémios eram feitos 'por fora'". "Era pegar ou largar. Não devia ter aceitado, mas se não aceitasse não teria trabalhado no segundo maior banco na altura", afirmou já depois em julgamento. 

Momentos depois de saber que se arrisca a ser o primeiro ex-ministro a ser condenado por corrupção, Manuel Pinho voltou ao tema dos pagamentos ‘por fora’ para sublinhar que ele não declarou “como todos os outros que tinham uma relação laboral com o GES” e ainda dissimulou um contrataque: “há outros que eram casados com juízas e também não declararam”.

Pinho referia-se a uma das vitórias que obteve em sede de julgamento e que levou, inclusive, a mudar toda a calendarização do mesmo. Em outubro do ano passado, a sua defesa conseguiu provar que o ex-marido de uma das juízas também tinha recebido dinheiro do saco-azul do GES - em particular: 1,2 milhões de euros através da mesma sociedade que pagou durante anos a Pinho. Isto levou a que Margarida Ramos Natário pedisse escusa do processo, tendo sido substituída mais tarde. 

As pensões e a máquina de flippers: do arresto à recuperação...ao arresto novamente

Paralelamente àquilo que estava a ser discutido em tribunal, Manuel Pinho viu-se a braços com uma outra luta judicial. Em fevereiro de 2022, na sequência de buscas domiciliárias, o juiz Carlos Alexandre decretou o congelamento da pensão de 15 mil euros mensais que o ex-ministro auferia, deixando o antigo ministro a viver com 2115 mensais declarados - para assegurarem a subsistência mensal do arguido. 

Mais de um ano depois, em maio de 2023, Pinho conseguiu que a Relação de Lisboa ordenasse a restituição da pensão - e também os vinhos, peças de artesanato, tacos de golfe e uma máquina de flippers que lhe haviam sido apreendidos durante as buscas. Mas em julho de 2023 - mesmo antes do início das férias judiciais - o juiz Carlos Alexandre avançou com uma nova tentativa e decretou mais uma vez o arresto da pensão. 

Tudo isto culminou em março de 2023, altura em que o Tribunal da Relação voltou a dar razão ao antigo ministro da Economia e levantar-lhe o arresto da pensão. Entretanto, a defesa do ex-governante anunciou que iria processar Carlos Alexandre pelo sucedido, acusando-o de “usar o sistema de justiça e o erário público para atingir objetivos pessoais de vingança”. 

Esta terça-feira, será a vez de a defesa de Manuel Pinho avançar para as alegações finais no processo EDP/CMEC. Para além do ex-ministro e de Ricardo Salgado, também a mulher de Pinho, Alexandra foi alvo de um pedido do MP de pena suspensa por 4 anos.
 

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