«Ninguém pode dizer que não tem medo» - TVI

«Ninguém pode dizer que não tem medo»

Quem esteve no Afeganistão e quem está à espera de ir revela os receios dos militares e a forma como aprendem a viver com eles

Recusam qualquer tipo de heroísmo, ou qualquer visão romântica das situações de conflito. Os tiros, o cheiro a pólvora, as explosões. À distância de um fio de vida, é tudo muito diferente da magia de Hollywood. Quem já esteve no Afeganistão aconselha todas as cautelas. Quem se prepara para partir, confessa a «ansiedade» e diz que «ninguém pode dizer que não tem medo».



Depois do exercício de treino matinal, o capitão Hugo Fernandes conversa com alguns colegas, à porta do edifício onde está a messe do Regimento de Infantaria nº 3 de Beja. Depois de um ano em Timor, em 2002, e de ter estado no Kosovo, em 2005, prepara-se para uma nova missão em terras afegãs.

«Em Timor havia a proximidade da língua», explica ao PortugalDiário, «era uma país vizinho e familiar». Já relativamente ao Kosovo, conta que «era uma situação instável». «Mas penso que aquilo que nos espera é uma situação bem pior», confessa.

De Beja a Kandahar

Nem todas as histórias podem ser contadas

Perante um cenário tão instável como o que irá encontrar no Afeganistão, diz que apenas a preparação física das forças especiais não chega. Não há Rambos, quando os tiros são a sério e o acompanhamento psicológico é uma componente forte do treino. «No caso dos comandos, a preparação começa no curso», refere, explicando que este é um processo continuado «no decorrer do treino e das próprias missões».

O major João Bernardino, militar experimentado, que já esteve no Afeganistão e se prepara para ir para o Kosovo, valida a importância da preparação mental. A prudência é fundamental para que tudo corra bem numa missão delicada e aconselha aos mais jovens que é necessário estar «sempre alerta» e «nunca facilitar». O pára-quedista confessa que o medo não é um sentimento estranho aos militares, mas que deve tornar-se um aliado.

Hugo Fernandes também pensa assim. «Tem que haver sempre medo. Ninguém pode dizer que não tem medo, porque as pessoas o sentem sempre», contudo, «há maneiras de o controlar». «O medo ajuda-nos a encarar as coisas de outra forma e a termos alguma segurança, a trabalhar melhor», sublinha.

Além do medo, há outro do sentimento latente. «Alguns militares que já lá estiveram têm ansiedade, porque vão encontrar o mesmo teatro de operações e acabam sempre por ter de se motivar para passar pelo mesmo. Aqueles que nunca foram tem mais ansiedade pela espera daquilo que irão encontrar».

E sobre as comparações entre um verdadeiro cenário de conflito e os de Hollywood, o capitão dos comandos diz: «Não tem nada a ver». Sabe que a missão que o espera «não irá ser fácil». «Mas temos uma missão a cumprir», aponta.
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