«Recordado como homem bom» - TVI

«Recordado como homem bom»

«Assassino em série» de Santa Comba Dão

Subdirector da PJ explica como levou o «homicida em série» de Santa Comba a confessar os crimes e diz que o arguido guardou um «troféu» das vítimas. Outro inspector negou ameaças ao ex-cabo e revelou por que razão este deixou de lhe falar

«Quero ser recordado como um homem bom que num momento teve um deslize». Foi com esta frase que o ex-cabo de Santa Comba Dão respondeu à pergunta do subdirector da Directoria de Coimbra, Almeida Rodrigues, ( Como quer ser recordado?»), durante o interrogatório realizado a 23 de Junho de 2006, nas instalações da PJ.

Almeida Rodrigues explicou esta quarta-feira em tribunal como jogou com a personalidade de António Costa para levá-lo a confessar o homicídio de três jovens suas vizinhas.

Durante as várias horas em que interrogou o militar na reserva, Almeida Rodrigues tentou convencê-lo a admitir os crimes e a revelar onde tinha escondido os corpos «para que as famílias pudessem fazer o luto».

«Houve teatralização nesta ida ao meu gabinete» referiu o inspector. O ex-cabo da GNR foi recebido «com toda a deferência» pelo subdirector da PJ de Coimbra. «Sabia do seu temor pela hierarquia», explicou. António Costa sentou-se em frente de uma mesa praticamente vazia.

«Havia uma fotografia aérea de Santa Comba» em cima da mesa «para causar impacte» e levar o arguido a pensar que a PJ possuía mais meios e informações do que realmente tinha.

Homicida em série guarda sempre um troféu da vítima

Ciente de que «um homicida em série guarda sempre um troféu da vítima», o inspector pediu-lho. António Costa começou por negar referindo que «tinha queimado tudo com um maçarico». Mais tarde admitiu que mantinha uma caneta de Isabel Cristina que por «ser um objecto vulgar» nunca o denunciaria.

Segundo o inspector, o perfil de «homicida em série» deu mais sinais. «Durante o interrogatório chorou», designadamente quando falou de Isabel Cristina. «Mas não foi de maneira nenhuma um choro sentido», explicou Almeida Rodrigues que acrescentou: «Tenho 25 anos de carreira e posso dizer que foi um choro do tipo: «eu tenho de chorar». Foi um choro «fingido».

No dia seguinte, o arguido participou na reconstituição dos crimes. «Ele é que indicou os locais e como se desfez dos corpos. O corpo de Joana só foi encontrado graças à informação do arguido», adiantou o subdirector da PJ de Coimbra. Além disso, demonstrou ter plena consciência da ilicitude dos seus actos quando explicou: «Deitei o corpo daqui porque dali podia estar alguém com binóculos e ver-me».

Durante a reconstituição atenuou o grau de agressividade com que realmente terá praticado os actos, mas «via-se que estava a representar um acto em que tinha participado». Almeida Rodrigues recorda ainda que o fígado da primeira vítima «estava completamente desfeito», indiciando a «agressividade extremamente grande» do arguido.

Almeida Rodrigues utilizou repetidamente a expressão «homicida em série» ao referir-se ao arguido. E explicou que, além de actuar com uma periodicidade de seis meses, seguido de um arrefecimento emocional, António Costa tinha consciência dos crimes.

A motivação do crime terá sido, segundo o inspector, «a salvaguarda do prestígio social, da imagem do homem temente a Deus. As motivações sexuais também se coadunam com o seu perfil.

Almeida Rodrigues não estranhou que o arguido insista agora em negar os crimes. «Era previsível. Só vem credibilizar a tese do homicida em série».

Sentado no banco dos réus, António Costa escutava atento os depoimentos, enquanto escrevia freneticamente num bloco A4. Amiúde acenava com a cabeça em sinal de discordância. Por vezes benzia-se.

Leia a continuação deste texto: «A culpa é das vítimas»
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