"Se pusermos num gráfico os pontos de Portugal vs Itália eles acompanham-se" - TVI

"Se pusermos num gráfico os pontos de Portugal vs Itália eles acompanham-se"

  • CM
  • 23 mar 2020, 22:40

Em entrevista a Miguel Sousa Tavares, o epidemiologista Manuel Carmo Gomes manifestou "bastante preocupação" com a evolução do surto de Covid-19 em Portugal, sublinhando, ainda, que é preciso proteger os idosos

O epidemiologista Manuel Carmo Gomes, professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, está "bastante preocupado" com a evolução do surto de Covid-19 em Portugal, que já matou 23 pessoas e infetou mais de 2.000.

Para Manuel Carmo Gomes há demasiados indicadores de proximidade ao que está a acontecer em Itália, o país do mundo mais afetado pela pandemia, com o número de mortos a ultrapassar os 6.000.

Em entrevista a Miguel Sousa Tavares, esta noite, na TVI, o especialista assumiu, ainda, estar apreensivo com o que poderá acontecer aos mais velhos.

Estamos correlacionados com Itália, embora com um delay (atraso, na tradução) de, aproximadamente, dez dias. Se pusermos num gráfico os pontos de Portugal vs Itália eles acompanham-se muito bem. Espero que, em breve, consigamos divergir em relação à Itália. Estou a falar da Itália porque conheço um bocadinho melhor os dados de Itália que da Espanha, mas em relação à Espanha não diria uma coisa muito diferente. Mas tenho esperança que as medidas que foram introduzidas a partir de dia 13 (de março), mas com efetividade a partir de dia 16, permitam que nós consigamos começar a sentir um abrandamento da curva, com o declive da curva a começar a diminuir um pouco. É a minha esperança", analisou.

Numa altura em que em Portugal começam a surgir as primeiras notícias de infetados e mortes por Covid-19 em lares de idosos, e atendendo ao que aconteceu em Itália e em Espanha, Manuel Carmo Gomes não tem dúvidas de que estamos perante um cenário alarmante.

Estava a olhar para os meus gráficos e reparo que, há coisa de 15 dias, a percentagem de idosos nos casos doentes era inferior à percentagem de idosos na população geral, o que sugere que estávamos a conseguir proteger, de alguma maneira, os nossos idosos. Se a probabilidade de um idoso ser contagiado for igual à dos outros, eles aparecem com a mesma percentagem nos casos que existem na população. Há 15 dias os nossos idosos representavam aproximadamente 14/15% dos casos. Repare que os idosos representam 28% da população, quase metade, e, paulatinamente, este valor tem vindo a aumentar. Os dados mais recentes mostram já que a percentagem de idosos nos doentes está ligeiramente acima dos casos. Quando olhamos para Itália e para Espanha, e vemos o que aconteceu, isto é extremamente alarmante. Nós temos de começar a levar isto muito a sério, nomeadamente para os idosos."

Isolar os mais velhos é, deste modo, uma solução? Manuel Carmos Gomes acredita que sim.

É um problema muito difícil e a única solução que me ocorre para lhes aliviar a dor, mas uma dor que lhes pode salvar a vida, são as novas tecnologias, que permitem que estejamos a conversar como se estivéssemos próximos. Mas é um problema em que temos de pensar. Os idosos, além de um risco elevadíssimo para doença grave, quando são internados facilmente ficam cinco/seis semanas no hospital e às vezes morrem depois disso. Está a ver o que isso representa para o SNS e para a ocupação das camas que temos para toda a população. É, absolutamente, necessário defende-los. Agora venham os sociólogos, psicólogos, ajudar-nos a refletir sobre isto e a criar estratégias para esta população."

Questionado sobre a possibilidade de uma segunda vaga de Covid-19 em Portugal, depois de ultrapassada a primeira, o epidemiologista avisou que é preciso estar preparado, tal como a China e a Coreia do Sul estão a preparar-se.

Mesmo que ultrapassemos isto e vamos ultrapassar com certeza, a incidência da doença comece a descer, a quantidade de portugueses que está imunizado, neste caso imunizado diretamente por contacto com o vírus, é relativamente baixa. Tenho dificuldade em dizer quanto, há pessoas com sintomatologia muito leve que não sabemos que chegaram a estar infetadas, mas estou convencido que não ultrapassará os 10/15/20%. Ora bem, este vírus tem capacidade para infetar 60/70/80% da população e a única proteção que teremos é aquilo a que os virologistas chamam imunidade de grupo, é aproximadamente 60%. Depois de ultrapassarmos esta onda, duvido que nos aproximemos dos 60%. Mas a onda pode vir, não é uma fatalidade. Estaremos na situação em que a China está neste momento, pode ter uma segunda vaga e eles têm um sistema de alerta, estão conscientes disto e estão a tentar evitá-la, portanto não é uma fatalidade, é uma coisa muito real. Mas se tomarmos as medidas que os chineses e os coreanos estão a tomar, tenho muito esperança que consigamos evitá-la. A sua dimensão pode ser praticamente idêntica à primeira, mas um pouco mais lenta, não terá este crescimento estonteante."

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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