O país de Sara - TVI

O país de Sara

Quem lá mora?

Na mesma semana em que uma criança de dois anos morreu, alegadamente vítima de maus tratos, uma pequena notícia diz-nos que algures «no primeiro semestre de 2007» existirá um programa informático que permitirá gerir os processos e trocar informação sobre crianças em risco.

Com outro governo, num outro tempo, poderíamos achar que se trata de coincidência. Mas, como disse há dias um ministro de Sócrates, a vida não é para ingénuos. E de facto só alguém muito distraído poderia achar que mortes como a de Sara seriam evitadas se um qualquer programa informático já corresse nos computadores das comissões de protecção de menores.

O país de Sara existe, lá fora, silencioso. Até que uma tragédia o revela. Nesse momento entra-nos em casa e compreendemos a exacta dimensão da nossa pobreza. Essa é a realidade que se esconde onde os números do governo (este e os anteriores, mas este pior, por parecer mais empenhado em convencer-nos de que não é bem assim) não alcançam.

É evidente que o facto de estes casos escaparem à eficiência da «protecção» de menores só prova que o assunto não merece a atenção devida. E se isso é um óbvio problema, infelizmente não é o maior. Mais do que identificar quem são as crianças em risco, e agir, é preciso procurar as causas que levam aos maus tratos. Alguém perderá tempo a tentar perceber quem são essas pessoas? Como chegam ali, àquele comportamento? Em cada história triste, como a de Sara, existem figuras distintas. Mas não custa identificar um quadro social e cultural semelhante, traços comuns. Um retrato que lamentavelmente nenhuma propaganda de Natal será capaz de mudar.

Na verdade, cada vez que ouvimos discutir taxas de crescimento, índices e coisas do género damos um passo ao lado e ficamos mais longe de entendermos o que realmente se passa e quem são os protagonistas destas histórias de horror. Por melhor que seja o programa informático.
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