Porque errar é humano - TVI

Porque errar é humano

Brigada do Trânsito

Condução com álcool, sem carta, injúrias à autoridade e pequenos furtos deixam de ser julgados em Lisboa. Em vez disso, arguido fará trabalho a favor da comunidade. Tudo para não «estigmatizar» as pessoas sem cadastro

Condução com álcool, sem carta, injúrias às autoridades e pequenos furtos são alguns exemplos de crimes que vão deixar de ser julgados em Lisboa. Em vez disso, o Tribunal de Pequena Instância Criminal vai apostar em medidas como o trabalho a favor da comunidade ou a atribuição de donativos a instituições de solidariedade social. Um condutor alcoolizado poderá, por exemplo, ter de acompanhar uma equipa do INEM durante a noite para tomar contacto real com as consequências de uma condução de risco.

A medida aplica-se apenas aos casos de flagrante delito, em arguidos sem antecedentes criminais e que cometeram ilícitos com pena prevista não superior a cinco anos de prisão.

Trata-se de pôr em prática a chamada «suspensão provisória do processo», prevista na lei de processo penal há vários anos, mas quase sem aplicação nos tribunais. O novo coordenador do Ministério Público no Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa, Júlio Pina Martins, adiantou ao PortugalDiário que a medida vai ser implementada «dentro de algumas semanas» e abranger anualmente milhares de processos.

Uma medida para «não estigmatizar as pessoas»

A suspensão provisória do processo consiste na aplicação ao arguido de determinadas regras de conduta durante um período de tempo, por forma a evitar o julgamento», explica o procurador da república. «O Estado/Ministério Público considera que estas medidas são suficientes em termos de prevenção geral e especial da criminalidade», acrescenta. «Não faz sentido que um jovem de 18 anos, que pegou no carro do pai e saiu para a estrada, seja levado a julgamento e fique com cadastro por causa disso», refere «A preocupação é tratar diferente aquilo que é diferente e não estigmatizar as pessoas».

Os arguidos ficarão sujeitos a medidas tão diferentes como: a não frequência de determinados locais, jardinagem, assistência hospitalar, ou o compromisso de tirar a carta de condução num prazo de seis meses». Excluídos da suspensão provisória do processo estão, no entendimento do procurador, os casos de condução em contramão. «A gravidade do crime impõe medidas como a retirada da carta de condução que apenas um juiz tem poder para decretar», explica.

A condução sob o efeito de «pequenas quantidades de álcool» também pode conduzir à suspensão provisória do processo. Sendo certo que a definição de «pequena quantidade» fica ao critério de cada procurador e que a taxa excederá sempre 1,2 grama/litro, dado estarem em causa ilícitos criminais.

O procurador não acredita que a medida venha a criar uma sensação de impunidade. Se não cumprirem as medidas (que serão acompanhadas pelo Instituto de Reinserção Social) seguir-se-á um inquérito criminal e o caso será julgado.

20 pessoas detidas diariamente em Lisboa em flagrante delito

Cerca de 20 pessoas são detidas, diariamente, em Lisboa em situação de flagrante delito. A maioria (70 por cento) já tem cadastro, pelo que tem de submeter-se a um julgamento. A suspensão provisória do processo aplica-se aos restantes casos.

Pina Martins estranha que a suspensão provisória do processo seja tão pouco aplicada no país. «A lei impõe a sua aplicação e se as inspecções aos tribunais nada dizem sobre o não cumprimento da lei, então o problema é das inspecções».

A medida só ainda não arrancou porque o Tribunal de Pequena Instância Criminal de Lisboa não dispõe de uma ligação directa e imediata à base de dados do Registo Criminal, indispensável para conhecer o cadastro dos arguidos. «Essa ligação foi solicitada à Directora Geral da Administração Judiciária que informou estar a tratar do problema. Justiça seja feita esta directora geral nunca me falhou uma promessa. É uma questão de poucas semanas».
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