Penalista diz que Noronha Nascimento não tem «distanciamento» para mandar destruir escutas - TVI

Penalista diz que Noronha Nascimento não tem «distanciamento» para mandar destruir escutas

«Muitas das horas, dos trabalhos e dos dias do presidente do STJ são (con)vividos com aqueles políticos», diz Costa Andrade

Relacionados
Um dos mais respeitados penalistas portugueses afirma que o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que mandou destruir as escutas a José Sócrates, não reúne à partida o distanciamento necessário para apreciar processos do primeiro-ministro. Costa Andrade, professor da universidade de Coimbra, ataca violentamente a reforma penal que tornou Noronha Nascimento no juiz particular de José Sócrates, porque os dois, por força das suas funções, vivem numa teia de cumplicidades.

O penalista introduz um argumento novo no debate: os deputados erraram ao entregar o controlo das escutas Cavaco Silva, Jaime Gama e José Sócrates a um juiz pré-determinado, que por força dos seus cargos mantém relações estreitas com os seus eventuais alvos processuais. «Muitas das horas, dos trabalhos e dos dias do presidente do STJ são (con)vividos com aqueles políticos. Frequentando os mesmos lugares, bebendo o mesmo champagne das vitórias, a mesma máscara dos dias de luto, fazendo-se eco das mesmas preocupações e cuidados, alimentando as mesmas expectativas», afirmou.

O facto de Noronha Nascimento ser presidente do Conselho Superior de Magistratura, tendo de negociar orçamentos com o Governo, é outro factor que prejudica, à partida, a sua posição como juiz do primeiro-ministro. «Hoje, bate à porta do chefe do Governo, a discutir, numa postura de inferioridade, recursos financeiros. As posições podem inverter-se amanhã, quando o presidente do STJ for chamado a pronunciar-se sobre escutas que possam atingir o chefe do Governo».

Costa Andrade considera que tudo se agravou pelo facto de Noronha Nascimento ter considerado que o seu despacho a favor da destruição das escutas como uma ordem definitiva e irrecorrível.

Noronha Nascimento, solicitado pela TVI, declinou comentar, mas o seu pensamento ficou expresso quando em Setembro, o jornal Sol noticiou que o filho do presidente do Supremo entrou para os quadros do sis, em 2009, ganhando um concurso com centenas de candidatos: «A que título é que um cidadão, que por acaso é filho do presidente do STJ, não pode ser escolhido num concurso, que terá provas de recrutamento extremamente rigorosas? A mesma questão não pode ser posta em relação a jornalistas que, também por acaso, são familiares próximos de políticos, juízes ou empresários?»

Costa Andrade, no seu extenso artigo, publicado no último número da revista legislação e jurisprudência, não se refere a esse caso e tem o cuidado de referir que não se pronuncia sobre pessoas, mas sobre os papéis que assumem num estado de direito. «O juiz tem de se mover, agir e decidir com distanciação e indiferença em relação às estruturas e papéis dos destinatários. Nada relevando o facto de ser convidado para tomar chá com a princesa ou de o seu enteado ter um lugar de relevo no gabinete do ministro».
Continue a ler esta notícia

Relacionados