Temperaturas no Ártico 20 graus acima do previsto para novembro - TVI

Temperaturas no Ártico 20 graus acima do previsto para novembro

Em vias de extinção

"Esta é de longe a temperatura mais elevada” na era da informação recolhida por satélite, que começou em 1979, afirmou Martin Stendel, investigador das alterações climáticas

As atuais bizarras temperaturas elevadas no Ártico, influenciadas designadamente pelo calor acumulado nos oceanos e pelos ventos do norte, têm sido reforçadas pelo “círculo vicioso” das alterações climáticas, afirmaram hoje cientistas.

A temperatura acima do gelo polar tem excedido a média entre nove a 12 graus Celsius (ºC) nas últimas quatro semanas, de acordo com os dados registados pelo Instituto Meteorológico Dinamarquês (DMI, na sigla em inglês), que anota as mudanças horárias na temperatura do Ártico.

E durante vários dias da última semana, as temperaturas no Polo Norte estiveram nuns balsâmicos 0ºC, que representam 20ºC acima dos níveis típicos de meados de novembro, afirmou Martin Stendel, um investigador das alterações climáticas no DMI, baseado em Copenhaga.

Esta é de longe a temperatura mais elevada” na era da informação recolhida por satélite, que começou em 1979, disse à agência noticiosa AFP, reforçando: “O que estamos a ver é muito raro”.

Nesta altura do ano, o oceano Ártico, aberto e exposto pela fusão do gelo durante o verão, deveria estar a congelar outra vez, com milhares de quilómetros quadrados a congelar em cada dia.

Mas isto não está a acontecer, pelo menos ao mesmo ritmo, disse Stendel.

Não só o gelo não está a crescer como deveria normalmente, como está a continuar a haver fusão devido ao ar quente que está a chegar”, especificou, durante uma conversa telefónica.

O Centro de Informação sobre Gelo e Neve dos EUA informou que a superfície do gelo em outubro foi a mais baixa desde que já registos, com 6,4 milhões de quilómetros quadrados.

A cobertura de gelo no topo do mundo encolheu para sua área mais pequena em 2016 no dia 16 de setembro, com 4,14 milhões de quilómetros quadrados.

Vários fatores causaram o sobreaquecimento do Ártico desde o fim de outubro, adiantaram os cientistas.

O mais imediato corresponde aos ventos quentes provenientes da Europa Ocidental e da costa ocidental de África.

Os ventos que trazem este calor são um temporário – e totalmente inédito – fenómeno meteorológico”, afirmou Valerie Masson Delmotte, cientista no Laboratório de Ciências Ambientais e Clima, de Paris.

Um segundo contributo vem do fenómeno El Nino

Mas o principal contributo vem das alterações climáticas, destacaram os cientistas.

A tendência de longo prazo de redução do gelo no oceano Ártico pode ser atribuída às alterações climáticas”, afirmou Ed Blockley, cientista principal do Grupo do Clima Polar, integrado no Serviço de Meteorologia (Met Office) britânico.

As alterações climáticas de responsabilidade humana, causadas pelos gases com efeito de estufa, já provocaram a subida da temperatura média da superfície terrestre em 1ºC desde a era pré-industrial.

No Ártico, porém, o ritmo do aquecimento tem sido o dobro da média, atribuído pelos cientistas a um círculo vicioso designado pelos cientistas por “retroação positiva” (“positive feedback”).

Cerca de 80% da radiação solar é reemitida para o espaço quando incide sobre o gelo e a neve branca, o que Delmotte classifica como “um efeito de espelho” (“mirror effect”).

Mas quando os mesmos raios de sol incidem sobre a água do oceano, que está agora muito mais exposta, 80% deste aquecimento é absorvido pela água e aí fica armazenado.

Se olhar para a extensão do gelo no mar, vê o ciclo vicioso imediatamente, porque há uma clara tendência descendente”, pormenorizou Stendel.

E no curto prazo, esta exposição da água do mar está a diminuir a reconstituição do gelo.

Com uma temperatura de apenas 0ºC, a água do mar está muitíssimo mais quente “comparada com o gelo que aí devia estar”, acrescentou.

As temperaturas do ar acima do gelo espesso, que deveria existir em vez do mar aberto, “são geralmente negativas entre -30ºC a -40ºC”.

A perda da cobertura de gelo, e o implícito aquecimento, pode ter consequências muito mais extensas.

Amplifica o aquecimento global, em geral, e aumenta o aquecimento nos continentes vizinhos”, disse Delmotte à AFP.

Uma das massas terrestres vizinhas é a Groenlândia, cuja imensa camada de gelo, que está a derreter rapidamente, contém água suficiente para elevar os níveis do mar em vários metros.

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