"Estão a fabricar aviões defeituosos", garante denunciante da Boeing - TVI

"Estão a fabricar aviões defeituosos", garante denunciante da Boeing

  • CNN
  • Chris Isidore e Gregory Wallace
  • 18 abr, 12:39
Boeing 787 Dreamliner (AP)

Engenheiro da Boeing ouvido esta quarta-feira no Senado afirmou ter "sérias preocupações sobre a segurança dos aviões 787 e 777" e disse também estar "disposto a correr riscos profissionais para falar sobre elas"

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A reputação já abalada da Boeing sofreu mais um golpe em duas audiências da comissão do Senado na quarta-feira, no Capitólio, EUA, com testemunhas a questionar a forma como a empresa constrói aviões e a segurança desses aviões.

Uma das principais testemunhas foi o engenheiro da Boeing Sam Salehpour, um denunciante que disse ter sido ameaçado por ter transmitido preocupações de segurança aos seus superiores durante vários anos, mas que estava a testemunhar devido à sua convicção de que "estão a fabricar aviões defeituosos".

"Tenho sérias preocupações sobre a segurança dos aviões 787 e 777 e estou disposto a correr riscos profissionais para falar sobre elas", afirmou na sua declaração inicial. Quando manifestou as suas preocupações, foi "ignorado": "Disseram-me para não criar atrasos. Disseram-me, francamente, para me calar."

Afirmou que a Boeing utilizou uma quantidade de força "desmedida e ilimitada" - incluindo pessoas que saltaram para cima de peças do avião - para corrigir o desalinhamento entre secções de jatos e que a diferença acabou por ser muito superior aos 5/1000 de polegada permitidos pelas normas da própria Boeing.

A Boeing não teve testemunhas em nenhuma das audiências de quarta-feira, mas numa reunião de informação no início desta semana defendeu as normas utilizadas para construir os aviões. A Boeing afirmou que a diferença de 5/1000 de polegada é apenas a largura de um cabelo humano ou de duas folhas de papel e que se trata de uma norma "hiper-conservadora". A Boeing afirmou que, mesmo quando a folga é maior do que a originalmente prescrita, as inspeções dos jatos não revelaram sinais de fadiga ou outros problemas, mesmo após anos de serviço.

Mas Salehpour disse que as garantias da Boeing não são válidas.

"Quando se opera a 10.000 metros, o tamanho de um fio de cabelo humano pode ser uma questão de vida ou morte", argumentou.

"Eu tenho uma atitude muito negativa em relação à cultura de segurança. Quando falo de algo ao meu chefe, ele impede-me de documentar ou enviar informações. Quando um gestor de qualidade diz para não enviar um assunto a um especialista... isso é preocupante", revelou mais tarde na audiência.

A Boeing emitiu um comunicado no final do dia a defender a segurança dos seus aviões, afirmando que, em 13 anos de serviço, a frota 787 transportou em segurança mais de 850 milhões de passageiros em mais de 4,2 milhões de voos, enquanto a frota 777 transportou em segurança mais de 3,9 mil milhões de passageiros em todo o mundo.

"Sob a supervisão da FAA [regulador norte-americano da aviação], inspecionámos e refizemos meticulosamente os aviões e melhorámos a qualidade da produção para cumprir normas rigorosas que são medidas em centésimos de polegada", sublinhou a Boeing. "Estamos plenamente confiantes na segurança e durabilidade do 787 Dreamliner. Estamos plenamente confiantes na segurança do 777, que continua a ser a família de aviões widebody de maior sucesso na história da aviação."

Outra testemunha, Ed Pierson, antigo gestor da Boeing e diretor executivo da Fundação para a Segurança da Aviação, afirmou que a falta de documentação fornecida aos investigadores da Comissão Nacional de Segurança dos Transportes, após a explosão de um tampão de porta de um Boeing 737 Max da Alaska Airlines, em janeiro, equivale a "um encobrimento criminoso".

"Existem registos que documentam detalhadamente o trabalho frenético realizado no avião da Alaska Airlines e os líderes empresariais da Boeing também o sabem, porque lutaram para ocultar esses mesmos registos condenatórios após os dois acidentes com o Max", acusou nos seus comentários iniciais.

Mas a Boeing ainda não forneceu documentação aos investigadores federais sobre os funcionários que trabalharam no tampão da porta que se desprendeu do avião da Alaska Airlines devido à falta de quatro parafusos necessários para manter o tampão no lugar. A Boeing disse recentemente que procurou registos, mas acredita que os seus empregados não documentaram o trabalho.

Os senadores de ambos os lados do hemiciclo manifestaram a sua preocupação com o testemunho.

"Esta história é séria e até chocante", observou o senador democrata Richard Blumenthal, de Connecticut, presidente da subcomissão permanente de investigação do Senado. "Há alegações sérias e crescentes de que a Boeing tem uma cultura de segurança quebrada e um conjunto de práticas que são inaceitáveis."
 

O engenheiro de qualidade da Boeing, Sam Salehpour, prepara-se para testemunhar durante a audiência da Subcomissão de Investigações da Segurança Interna e Assuntos Governamentais do Senado, a 17 de abril de 2024. Bill Clark/CQ Roll Call/Sipa

O deputado adiantou que, desde que a audição foi anunciada, a sua comissão teve conhecimento de outros denunciantes dentro da Boeing. Um mecânico de uma fábrica não sindicalizada da Carolina do Sul escreveu que, quando apresentou as suas preocupações, foi "informado de que centenas de outros estavam à espera dos nossos empregos do lado de fora dos portões".

"A Boeing está num momento de ajuste de contas", considerou Blumenthal. "É um momento que está a ser preparado há muitos anos. É um momento que não resulta de um incidente, de um voo ou de um avião."

Na reunião de segunda-feira, antes da audiência, a Boeing disse que tem incentivado os funcionários a apresentar preocupações de segurança e, desde o incidente aéreo no Alasca, que isso tem acontecido em muito maior número.

Mas o membro do comité, o senador republicano Ron Johnson, do Wisconsin, disse que, embora "todos queiramos que a Boeing tenha sucesso", também é importante ouvir os denunciantes.

"O que eu não quero que este comité faça é assustar o público americano", defendeu. "No final, quero que o público tenha confiança ao entrar num avião. Mas tenho de admitir que este testemunho é mais do que preocupante... Temos de nos preocupar. Temos de chegar ao fundo da questão."

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