A inflação [na zona euro] é possivelmente mais persistente e, portanto, a taxa de juro necessária para a conter pode ser mais elevada do que as estimativas económicas e os mercados financeiros assumem atualmente."
A afirmação aparece no último boletim económico do banco nacional neerlandês e é mais um aviso do que poderá acontecer na próxima reunião do Banco Central Europeu (BCE), dentro de 10 dias, em Frankfurt. A certeza é que Christine Lagarde e restantes membros do Conselho de Governadores vão decidir uma nova subida de taxas de juro. A dúvida é saber de quanto será a subida: 0,5 pontos? 0,75 pontos? Mais?
Se a profecia do banco central neerlandês se concretizar, então a subida não será pequena. Olhando para as taxas Euribor percebe-se que os mercados já estão à espera de uma subida expressiva.
A Euribor a seis meses, a mais usada no crédito à habitação em Portugal, registou um valor médio em setembro de 1,596%. Mas apenas contabilizando a primeira metade de outubro já vai em 1,901%.
Na Euribor a 12 meses o movimento é o mesmo: de uma média de 2,233% em setembro, já vai nos 2,561% em outubro.
Verdadeiramente ninguém sabe até onde as taxas de juro do BCE vão subir.
Atualmente, a principal taxa está em 1,25%. Mas a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), nas suas últimas previsões, trabalhou com uma taxa de 4%. E há poucos dias, o governador do Banco Central da Bélgica dizia que a sua aposta é de que iriam ultrapassar os 2%, mas também dizia que não seria uma surpresa se o BCE tivesse de “de ir acima dos 3% em algum momento."
A única certeza é que as taxas vão continuar a subir. A consequência é simples e em muitos casos dolorosa.
Os detentores de crédito à habitação cujo contrato vai ser revisto no próximo já mês podem contar com um novo aumento da prestação. E se para empréstimos de montante reduzido a subida pode ficar por pouco mais de 25 euros, nos contratos em que o montante em dívida é maior, a subida da prestação pode chegar aos 229 euros.
QUANTO VAI SUBIR A PRESTAÇÃO DE CRÉDITO À HABITAÇÃO EM NOVEMBRO
Empréstimo a 30 anos com spread de 1%
Empréstimo de 25 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 76,98 | Está a pagar | 75,05 | |
Vai pagar | 104,7 | Vai pagar | 113,11 | |
Aumento | 27,72 | Aumento | 38,06 |
Empréstimo de 50 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 153,78 | Está a pagar | 150,01 | |
Vai pagar | 208,14 | Vai pagar | 226,23 | |
Aumento | 54,36 | Aumento | 76,22 |
Montante do empréstimo: 75 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 230,67 | Está a pagar | 225,15 | |
Vai pagar | 312,21 | Vai pagar | 339,34 | |
Aumento | 81,54 | Aumento | 114,19 |
Montante do empréstimo: 100 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 307,55 | Está a pagar | 300,20 | |
Vai pagar | 416,28 | Vai pagar | 452,46 | |
Aumento | 108,73 | Aumento | 152,26 |
Montante do empréstimo: 125 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 384,44 | Está a pagar | 375,25 | |
Vai pagar | 520,35 | Vai pagar | 565,57 | |
Aumento | 135,91 | Aumento | 190,32 |
Montante do empréstimo: 150 mil euros | ||||
Euribor a 6 meses | Euribor a 12 meses | |||
Está a pagar | 461,33 | Está a pagar | 450,03 | |
Vai pagar | 624,43 | Vai pagar | 678,69 | |
Aumento | 163,10 | Aumento | 228,66 |
Como lidar com a subida dos juros?
Com as taxas Euribor e as prestações mensais do crédito à habitação a acelerar, os especialistas em finanças pessoais aconselham a quem esteja em dificuldade para pagar o seu crédito (ou preveja que venha a estar em dificuldade), que contacte o respetivo banco de forma a conseguir renegociar o contrato.
As opções são várias, mas as que se apresentam mais vantajosas são uma renegociação do ‘spread’, a margem que o banco cobra, ou um alargamento do prazo do empréstimo.
No primeiro caso, se se avaliar um empréstimo de 150 mil euros a 30 anos, com um ‘spread’ de 1%, caso esse ‘spread’ seja reduzido para 0,5%, a poupança na prestação mensal pode ultrapassar os 30 euros por mês.
No caso do alargamento do prazo do empréstimo, a poupança é ainda mais significativa. Para o mesmo empréstimo, um alargamento do prazo para 40 anos permitiria uma poupança superior a 100 euros por mês.
Outra das opções, para quem tenha poupanças que possa movimentar é fazer uma amortização antecipada de parte do empréstimo. Mais uma vez, para o mesmo empréstimo de 150 mil euros, a amortização, por exemplo, de 30 mil euros permitiria uma poupança de quase 100 euros por mês. Esta amortização tem, no entanto, uma penalização associada que pode ir até 0,5%, o que neste caso corresponderia a um custo único de 150 euros.
O que está o Governo a preparar?
As penalizações por amortizações antecipadas são, aliás, uma das medidas em vigor que o Governo quer alterar. O Ministério das Finanças já anunciou que iria suspender esta penalização durante o próximo ano de forma a ajudar as famílias com crédito à habitação.
A suspensão desta penalização é um incentivo para quem tem poupanças e pretende amortizar parte do empréstimo para reduzir a prestação mensal. Por outro lado, quando um devedor encontra uma melhor solução para o crédito à habitação num banco concorrente, a passagem do seu crédito para o outro banco pressupões sempre a amortização do primeiro empréstimo que, atualmente, fica sujeita a essa penalização.
Para além desta medida, o Governo está ainda a preparar legislação que facilite a possibilidade de os detentores de contratos de crédito à habitação poderem alargar o prazo do seu empréstimo.
No âmbito do Orçamento do Estado para 2023 o Governo também já decidiu que no próximo ano os contribuintes com contratos de crédito à habitação poderão beneficiar de uma taxa de retenção mensal de IRS inferior à que a lei determina. Na prática vai ser possível descontar mensalmente pela taxa imediatamente inferior à que descontaria sem esta nova regra.
Esta medida terá, no entanto, um impacto mensal reduzido e, em 2024, quando o contribuinte entregar a declaração de IRS referente aos rendimentos recebidos em 2023, terá um reembolso de imposto menor, uma vez que reteve menos IRS ao longo do ano, ou poderá mesmo vir a ter imposto a pagar.
No âmbito do acordo de Concertação Social, assinado entre governo e parceiros sociais, ficou ainda estabelecido que seria feita uma avaliação do impacto do aumento dos custos com a habitação no orçamento familiar, no sentido da construção de medidas que mitiguem estes mesmos impactos, até ao final do ano de 2022.
Retrato do crédito à habitação em Portugal
Indexante
No final de 2021 os indexantes mais frequentes eram a Euribor a 6 meses, em termos de número de contratos, e a Euribor a 12 meses, em termos de saldo em dívida.
A Euribor a 6 meses era o indexante de 40,5% dos contratos e de 29,1% do saldo em dívida, enquanto a Euribor a 12 meses era o indexante de 28,1% dos contratos e 40,4% do saldo em dívida.
A Euribor a 3 meses continuou a representar menos de um terço da carteira de crédito à habitação.
‘Spread’
O spread médio da carteira fixou-se em 1,21 pontos percentuais no final de 2021.
Taxa
Os contratos a taxa variável representavam 93% do número de contratos em carteira no final de 2021 e 91,1% do saldo em dívida.
Prazo
A maioria dos contratos no final de 2021 (64,4%) tinha prazos iniciais entre os 25 e os 40 anos, destacando-se os prazos entre 35 e 40 anos (27%) e entre 25 e 30 anos (24,2%). O prazo remanescente dos contratos no final de 2021 era de 21,5 anos.
O prazo médio dos contratos em carteira a 31 de dezembro de 2021 era de 33,5 anos.
NOTA: As simulações foram corrigidas no dia 26 de outubro uma vez que o cálculo da parcela "Está a pagar" usava as taxas do mês errado fazendo que o aumento da prestação fosse ligeiramente inferior.