Incerteza, sobretudo, e a sensação de que algo ainda mais grave e dramático poderá ocorrer a partir desta quinta-feira, 10 de janeiro, levam a que o mundo esteja de olhos postos na Venezuela, esta quinta-feira.
Às 10:00 locais (14:00 em Lisboa) Nicolás Maduro Moros, 56 anos, antigo maquinista do metro de Caracas, pretende ser reempossado como presidente, fazendo finca-pé nos 67% dos votos que diz ter obtido nas eleições de 20 de maio do ano passado, um sufrágio que a oposição não aceita e contesta, com acusações de fraude.
Maduro, sucessor de Hugo Chávez, após a sua morte, está agora convocado para novo mandato. Não pela Assembleia Nacional, dominada pela oposição e que já disse que a posse será um "ato de usurpação do poder", mas antes pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) do país sul-americano.
Maikel Moreno, o presidente do TSJ, já tornou público o acto em que pretende empossar o 58.º presidente da República Bolivariana da Venezuela.
TSJ convoca para el próximo 10 de enero al ciudadano Nicolás Maduro Moros para ser juramentado como presidente constitucional en el período 2019-2025 https://t.co/I8CdJQdI9r pic.twitter.com/npWzuaA6XN
— Maikel Moreno (@MaikelMorenoTSJ) 8 de janeiro de 2019
Armas nas mãos
Do lado de Maduro, num momento mais do que tenso no país latino-americano onde vivem largos milhares de emigrantes portugueses e lusodescendentes, surgem as milícias populares nascidas durante o poder chavista, que prometem e mostram um apoio musculado ao Partido Socialista Unido da Venezuela.
Nos conhecidos "colectivos", vistos por muito como forças paramilitares do chavismo, a palavra de ordem para esta quinta-feira é de mostrar a força nas ruas.
Com a espingarda nas mãos. Até à vitória, sempre!", foi o repto de Valentín Santana, chefe do colectivo "La Piedrita", que liderou uma caravana que percorreu a capital Caracas mobilizando os apoiantes e sobre quem, segundo o jornal espanhol El Mundo, recai um mandado de busca e prisão há duas décadas, por dois casos de homicídio.
Face à ameaça dos "colectivos" chavistas de pegar em armas, é certo que, nos últimos dias, o próprio Nicolás Maduro também não tem feito a coisa por menos. Tal como os membros do seu governo, que têm apelado à demonstração da força popular que o apoia nas ruas.
A 10 de janeiro, quero o movimento estudantil nas ruas, defendendo a revolução. Vamos preparar as milícias universitárias: estudo e arma!", foram palavras do próprio presidente, citado pelo jornal El Mundo, enquanto o número dois do regime, Diosdado Cabello, convocava "todo o povo" para participar do acto de quinta-feira, que prevê mesmo um desfile militar.
Exigimos respeito e temos o quê! As Forças Armadas expressam seu apoio irrestrito e lealdade absoluta ao presidente e nosso comandante-chefe", enfatizou, na terça-feira, o general Vladimir López Padrino, atual minsitro da Defesa.
Exército e parlamento
Hemos alcanzado la paz gracias a la hidalguía y conciencia de un pueblo que ejerce su derecho constitucional, para elegir su propio destino. ¡Venezuela eligió la Paz! pic.twitter.com/ROsO5ZO1pg
— Nicolás Maduro (@NicolasMaduro) January 9, 2019
Do outro lado da barricada, a Assembleia Nacional, dominada pelo oposição, recusou a nova investidura de Nicolás Maduro. E chegou mesmo a apelar às Forças Armadas para "restaurar a democracia" no país. A vice-presidente Delsa Solorzano negaria estar a apelar a "um golpe de Estado", segundo o jornal espanhol El País, mas insiste que "Maduro é um usurpador".
Desde #SesionAN “Maduro es un usurpador, un invasor en Miraflores” https://t.co/XGVR9jxHPL
— Delsa Solorzano (@delsasolorzano) 8 de janeiro de 2019
Empossado como presidente do parlamento venezuelano no passado fim de semana, o jovem deputado Juan Gaidó insistiu que as eleições de maio foram "irregulares", não aceitando o novo mandato de Nicolás Maduro. E foi de imediato premiado pelo aplauso dos Estados Unidos, os mais acérrimos opositores ao governo venezuelano, fora de portas, para quem só a Assembleia Nacional da Venezuela é a única instituição legítima no país.
A Assembleia Nacional deve inspirar esperança [...] de um futuro pacífico, próspero e democrático, mesmo quando o regime corrupto e autoritário de [Nicolás] Maduro e dos seus aliados tenta negar esse direito aos venezuelanos", afirmou então em comunicado o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Robert Palladino.
Contagem de espingardas
Estados Unidos e União Europeia recusam aceitar os resultados das eleições e mantêm sanções, políticas e económicas, à Venezuela, isolando internacionalmente o governo de Nicolás Maduro.
Os países da União Europeia não estarão representados esta quinta-feira na posse de Maduro - Portugal, incluído - e exigem um novo acto eleitoral. Também muitos estados latino-americanos estarão ausentes, em especial dos que integram o Grupo de Lima, criado na capital do Peru, em agosto de 2017, com o objetivo declarado de "abordar a crítica situação da Venezuela e explorar formas de contribuir para a restauração da democracia naquele país através de uma saída pacífica e negociada".
Contra todos os que exigem mudança na Venezuela, Nicolás Maduro tem apostado nos últimos dias em contabilizar e mostrar supostos apoios internacionais. Seja da Rússia, da China, de Cuba e da Organização dos Países Produtores de Petróleo (OPEP), que a Venezuela integra, dadas as brutais reservas que o país possui.
Sostuve un ameno y agradable encuentro con Mohammed Barkindo, Secretario General de la OPEP. Conversamos sobre los retos del mercado petróleo para este año 2019 y me expresó los buenos deseos de los países miembros de la OPEP en el inicio del nuevo periodo presidencial. pic.twitter.com/uIsWYT4yzq
— Nicolás Maduro (@NicolasMaduro) January 9, 2019
"Resposta proporcional e oportuna"
Aos que o ostracizam e condenam além-fronteiras, Nicolás Maduro resolveu ameaçar com uma tomada firme de posição no futuro: "Àqueles que não reconhecerem a legitimidade das instituições venezuelanas daremos uma resposta proporcional e oportuna. Atuaremos com muita firmeza porque a Venezuela respeita-se, seja a quem for no mundo".
Daremos uma resposta firme, clara, oportuna e imediata pela afronta que qualquer Governo ou qualquer instância internacional intente contra o nosso país. A Venezuela tem quem a defenda", frisou Nicolás Maduro, na passada segunda-feira, falando à imprensa no palácio presidencial de Miraflores, em Caracas
Apesar de ter uma reserva de petróleo considerada das maiores do planeta, a Venezuela atravessa há vários anos uma profunda crise económica e política, agravada pelas sanções vindas de diversas partes do globo, em particular dos Estados Unidos e da União Europeia.
Com uma inflação galopante e com falta de mantimentos e de medicamentos, a Venezuela assistiu ao exílio de cerca de 2,3 milhões de pessoas (7,5% da população), desde 2015, que procuraram outros países, nomeadamente o Brasil.
Apesar da crise, que tem levado ao aumento de protestos nas ruas, saques e pilhagens nas ruas das principais cidades venezuelanas, Maduro crê manter o apoio esmagador entre os mais de 30 milhões de concidadãos.
Conseguimos a paz, graças à nobreza e consciência de um povo que exerce o seu direito constitucional de escolher o seu próprio destino. A Venezuela escolheu a paz!", é a mensagem que difunde Nicolás Maduro, a horas de ser reempossado como presidente da Venezuela.
Hemos alcanzado la paz gracias a la hidalguía y conciencia de un pueblo que ejerce su derecho constitucional, para elegir su propio destino. ¡Venezuela eligió la Paz! pic.twitter.com/ROsO5ZO1pg
— Nicolás Maduro (@NicolasMaduro) January 9, 2019