Cristina Branco: «Nós não somos números, somos pessoas» - TVI

Cristina Branco: «Nós não somos números, somos pessoas»

Cantora falou ao TVI24.pt sobre «Alegria», disco que reflete a sociedade portuguesa através de personagens com nome próprio

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Cristina Branco está de volta aos discos e desta vez com um retrato bem vivo do Portugal dos dias de hoje. «Alegria» é o título paradoxal de um álbum feito de personagens que espelham bem as dificuldades de um país em crise.

«No fundo, elas falam de si próprias refletindo uma sociedade que, de alguma maneira, desapareceu - estamos a falar da nossa classe média, por exemplo», explicou Cristina em entrevista ao TVI24.pt.

«São pessoas de hoje que refletem sobre o seu passado, vivem um presente doloroso e refletem sobre o que será o seu futuro.»

Criadas por Cristina em colaboração com vários autores portugueses, como Manuela de Freitas, Gonçalo M. Tavares e Miguel Farias, encontramos em «Alegria» muitas personagens femininas, todas elas com um nome próprio.

«Numa altura em que olham para ti como um número, eu gosto de apontar as pessoas com um nome. Quando tens um nome (...) passas a ter uma identidade, passas a ser gente, finalmente. Nós não somos números, somos pessoas. É importante que olhem para nós como gente», defendeu a cantora.

Cristina Branco: «Não podemos comer e calar eternamente»

Temos então «Miriam», uma «queque do Chiado» que à noite se transforma numa espécie de Robin dos Bosques e rouba comida e sonhos para os sem abrigo e para os «pobres de espírito». «Cândida» perdeu-se para o mundo das drogas e da prostituição depois de ter ficado sem casa por não a conseguir pagar.

Passamos a conhecer melhor a Deolinda, essa mesmo, nas palavras de um dos seus principais criadores, Pedro da Silva Martins.

«Muitas vezes, aquilo que as pessoas depreendem da Deolinda é uma coisa festiva. É alguém que critica e que aponta o dedo, mas não se percebe realmente quem é a Deolinda. E a reflexão do Pedro é justamente essa, é dizer que: "Eu, Deolinda, não sou o que vocês pensam que sou". Ela é festiva, mas não é um ser alegre. É alguém que reflete sobre si própria, sobre a sua importância na sociedade portuguesa», contou Cristina Branco.

Com Jorge Palma, Cristina construiu a versão feminina de «Jeremias o Fora da Lei». «Branca Aurora» é uma personagem contestatária, que «troca um cocktail por um cocktail molotov», e com uma eco-consciência bastante ativa: «Ela pega naquilo que mais ninguém quer, vai aos mercados durante a noite e reaproveita a comida [desperdiçada]».

O single de apresentação do disco é «O Lenço da Carolina», canção sobre uma mulher forçada a emigrar em busca de uma vida melhor, deixando para trás um namorado que sofre ao perdê-la para outros amantes.

«Ela vai, de facto, à procura de uma vida melhor. Ela não encontra soluções cá dentro [do país]. [E] é uma emigrante emocional porque tens o desgraçado do namorado que fica eternamente a bordar lenços e à espera que ela volte.»

E se ministros e catedráticos fossem lavar chãos?

Entre os 13 temas do álbum encontramos também «Petição do Farias para Alegria de Ministros e Catedráticos». Uma proposta para que os governantes deste país tentem a sorte como empregados de limpeza.

«[É uma canção] que evoca determinadas personalidades da nossa sociedade e é um convite aos ministros e catedráticos: "Por que não aprenderem a lavar chãos? Porque a verdade é que vocês não sabem exatamente o que se está a passar aqui. 'Bora lá, cá para dentro, para verem como é que é [a vida]», disse Cristina sobre o tema com letra assinada por Miguel Farias e com a participação do pianista Mário Laginha.

«Eu acho fundamental falar de determinadas coisas. E se tu tens o "poder" de comunicar com os meios de uma forma mais direta, de ter uma exposição mais direta com uma comunidade, então deves aproveitá-lo. E foi exatamente esse o meu intuito», afirmou.
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