Perto de Fátima, longe do Papa - TVI

Perto de Fátima, longe do Papa

Fátima 2010 (Fotos de Cláudia Lima da Costa)

Peregrinos dizem que não caminham para ver Bento XVI e que sentem saudades do «Papa peregrino»

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«Se tivésseis a fé do tamanho de um grão de mostarda, diríeis a esta montanha: transporta-te daí para ali e ela se transportaria, e nada vos seria impossível». Esta frase de Jesus de Nazaré no Evangelho de S. Mateus habitará a mente de muitos dos peregrinos que chegam a Fátima a pé. Não se vêem montanhas a andar de um lado para o outro nas redondezas. Mas há muita geografia sob os pés destes caminhantes. Dizem que apenas a fé os anima. Já a visita de Bento XVI, advinha-se mais no aparato logístico na cidade do que no entusiasmo dos peregrinos: «É um Papa. É mais um».

São 15:00. A três quilómetros a sul de Fátima, alinham-se fluorescências amarelas na berma da estrada. Paulo e Cláudia Ribeiro explicam que já é assim desde a semana passada. O casal abriu um restaurante no sábado, com as janelas permanentemente salpicadas pelos reflexos dos coletes dos peregrinos, que aceleram passo, com a proximidade do Santuário.

Nazaré Inácio, de 54 anos, caminha ao lado de Cátia Pires, 15 anos mais nova. São as duas arrastadas por Luís Dias. Elas partiram de Alverca, ele de Póvoa de Santa Iria. Aceitam falar, mas dizem que parar não conta. Têm pressa. «Saímos domingo, às seis da manhã», diz Nazaré ao tvi24.pt. Solta um sorriso. «Acumulei promessas. Estou a pagá-las todas».

Cátia é uma estreante. A cadência do passo não deixa transparecer todas as marcas do caminho. «Estiveram a coser-me os pés, ali atrás, por causa das bolhas». Sem perder a boa disposição, conta que os bombeiros não a deixaram ver como estão, antes de os envolverem em ligaduras. Mais do que preocupada, parece curiosa.

«Nem sabia que o Papa vinha»

Falam de «fé», de «Nossa Senhora», de «promessas», quando se lhes pede para explicarem as razões da viagem. O Papa só surge na conversa pela voz dos repórteres: E o Papa? «Não gosto deste Papa. Gostava mais do outro», atira Nazaré. «Eu também», reforça Cátia. «Este a mim não me diz nada. Deus me perdoe, mas não me diz nada». Luís, que ainda não teve direito à palavra nesta reportagem, sem ter ouvido estas, quase as repete. Sílaba a sílaba: «A mim não me diz nada». «João Paulo II era uma pessoa muito mais dada ao povo».

Caminha como se tivesse acabado de começar a caminhar. Teve um acidente há anos que lhe deixou marcas no braço esquerdo. Toda a força que perdeu nele parece correr-lhe nas pernas. Puxa pelas colegas de caminhada. «Ele é o nosso motor». «Todos os anos sabe-me bem vir e ajudar as pessoas que vêm comigo. Tenho fé e promessas para cumprir. Quem caminha sem fé não consegue ter o espírito que tem o peregrino, que é capaz de tudo», diz.

São 15:30. No posto de socorro nº 3, a quatro quilómetros de Fátima, Margarida Pinto, de 59 anos, pega nas últimas palavras de Luís e fotografa-as na forma de uma senhora sorridente com um pé torcido dentro de uma bacia. Enquanto uma socorrista o massaja, ela fala, por ela e pelo grupo de 27 pessoas com quem viaja. «Saímos de Sesimbra na quinta-feira às 5:30 da manhã». Veio por causa do Papa? (Teima a curiosidade dos repórteres). «Quando decidi vir nem sabia que o Papa vinha. Adorava o outro Papa. Não estou muito ligada a este».

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