Sem-abrigo tiveram Natal - TVI

Sem-abrigo tiveram Natal

  • Portugal Diário
  • 14 dez 2007, 19:28
Natal dos sem-abrigo - Foto de Tiago Petinga para Lusa

Fotos: Apesar do roubo houve comida e roupa para distribuir

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Comida, roupa, música e cabeleireiro esperam pelos sem-abrigo e pessoas carenciadas de Lisboa na festa de Natal da Comunidade Vida e Paz, que oferece ainda oportunidades para mudar de vida, escreve a Lusa.

Vestido com a camisola de voluntário a orientar as centenas de pessoas que acorreram ao refeitório da Universidade de Lisboa, onde a festa se realiza há cinco anos, Vítor Raposo conhece bem «o outro lado».

Nascido nos Açores, durante «22 anos», a heroína comandou-lhe a vida. Sem falar com muito pormenor, adianta que depois de se divorciar, veio para o Continente «para morrer, de forma rápida».

Centrou-se no Casal Ventoso, centro de venda e consumo de droga de Lisboa, e vivia «em caixotes», na Avenida de Ceuta.

Mas a ajuda chegou antes da dose fatal: «assistentes sociais que eu conhecia falaram-me da Comunidade Vida e Paz e fui ter com eles em 2003, foi quando fiz a minha primeira reinserção».

«Depois, tive uma recaída. Depois de 14 meses com eles pensei "estou farto, já chega" e voltei para a rua, mas arrependi-me muito», conta.

Voltou a aceitar ajuda, e acredita que desta vez, não vai voltar a recair. A meta agora é sair da protecção da comunidade e arranjar trabalho.

«Pré-reinserção»

«Desde Março que estou na fase conhecida por pré-reinserção. Tenho feito uns cursos de olaria e estou à espera de arranjar um curso remunerado do Fundo Social Europeu ou um emprego. Assim que tenha uma saída segura, vou à minha vidinha», afirmou.

Para Vítor, o facto de já ter estado numa situação desesperada dá-lhe outra perspectiva sobre as dificuldades de quem enche as filas para receber roupa ou comida: «já estive "lá", onde eles estão agora e tenho muita facilidade em percebê-los, falar com eles e mostrar-lhes que eu sou a prova de que é possível sair», salienta.

Elizabete Cardoso, da Comunidade Vida e Paz, disse à Agência Lusa que a festa recebe «sem-abrigos e famílias carenciadas que têm um tecto, mas vivem em dificuldades».

«Convidamo-los a trazer a família e os amigos», refere, acrescentando que além da roupa, distribuída conforme as necessidades, da comida e da animação, o cabeleireiro é das coisas que atrai mais atenção.

«Para a maior parte destas pessoas, o cabeleireiro é a última coisa em que pensam, mas torna-se importante para a auto-estima», refere.

Numa sala do refeitório da Universidade, estão já três cadeiras instaladas, doadas pelo antigo proprietário de um salão, à espera de clientes.

«Pessoas foram muito generosas»

Secadores e produtos de higiene foram alguns dos artigos roubados de um armazém da comunidade na semana passada, mas o coordenador da Vida e Paz, Pedro Melo, afirmou à Agência Lusa que «as pessoas foram muio generosas com ofertas para compensar» o roubo.

«Empresas que já tinham dado voltaram a doar e especialmente particulares mostraram uma generosidade comovente», frisou, acrescentando que a polícia «já interrogou dois suspeitos» do roubo, mas os responsáveis da comunidade não esperam grandes resultados da investigação.

Sem certeza sobre o número de pessoas que procurarão a festa durante os três dias, Pedro Melo recorda que no ano passado atenderam 2.500.

Quanto a voluntários, há 1.300 pessoas inscritas, «muito mais do que o necessário», adiantou Elizabete Cardoso, explicando que optaram por aceitar «toda a gente» e estabelecer turnos de duas horas.

Para muitos voluntários, a festa de Natal é o primeiro contacto com a comunidade e os seus centros terapêuticos, onde «se ensina a pescar».

Elizabete Cardoso afirmou que parte importante da reinserção é mudar a mentalidade de quem acredita que «a vida não vale a pena e não tem nada a ver com aquilo que lhe acontece».
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