Em muitos países, cerca de uma em cada cinco novas mães sofre de perturbações de humor ou de ansiedade. Infelizmente, estas doenças muitas vezes não são diagnosticadas nem tratadas devido à falta de sensibilização e ao estigma e todos pagam o preço.
O Dia Mundial da Saúde Mental Materna é a altura em que se reconhecer a importância da saúde mental materna. Como pode saber se você ou um ente querido pode precisar de ajuda? Que tipos de tratamentos estão disponíveis? O que é que as mulheres grávidas ou no pós-parto podem fazer e como é que a comunidade à sua volta pode ajudar?
Para saber mais, falámos com a especialista em bem-estar da CNN, Leana Wen. Wen, mãe de dois filhos pequenos, é médica de urgência e professora associada adjunta na Universidade George Washington. Anteriormente, foi comissária de saúde de Baltimore e presidente da Behavioral Health Systems Baltimore, uma organização regional sem fins lucrativos que promove a saúde mental e o tratamento de perturbações relacionadas com o uso de substâncias.
CNN: Porque é que a saúde mental materna é tão importante?
Leana Wen: A saúde mental é uma parte essencial da saúde-geral. Por si só, a saúde mental influencia o bem-estar e tem um grande impacto na saúde física da mulher e do seu bebé.
As mulheres grávidas com problemas de saúde mental não tratados têm uma taxa mais elevada de falta de cuidados pré-natais. Têm maior probabilidade de sofrer de depressão, ansiedade, psicose e outras doenças mentais após o parto. As doenças mentais não tratadas também estão associadas a partos prematuros, bebés com baixo peso à nascença, problemas de sono e de alimentação do bebé, bem como problemas de desenvolvimento e cognitivos.
Infelizmente, nos Estados Unidos, as perturbações de saúde mental são uma causa subjacente de mortalidade em muitas mortes que ocorrem durante e após a gravidez. De acordo com os Centros de Controlo e Prevenção de Doenças dos EUA, 22,7% das mortes relacionadas com a gravidez estavam associadas a um problema de saúde mental - mais ainda do que hemorragias (13,7%) ou infecções (9,2%). Esta é uma crise e é preciso fazer muito mais para a resolver.
Quão comuns são os problemas de saúde mental materna?
Cerca de 10% das mulheres grávidas e 13% das mulheres no período pós-parto vão sofrer de um problema de saúde mental, sendo o mais comum a depressão, de acordo com a Organização Mundial de Saúde. Nos países desenvolvidos, incluindo os Estados Unidos, os números sobem para mais de 15% durante a gravidez e 19,8% após o parto.
Estes números são assustadores. Mas, igualmente preocupantes são os números relativos à falta de tratamento. Alguns estudos indicam que menos de 15% dos indivíduos com estas doenças recebem qualquer tratamento.
Imaginemos que estamos a falar de qualquer outra doença grave. Imaginemos que menos de 15% das pessoas com diabetes recebiam tratamento, ou que menos de 15% das pessoas com problemas cardíacos recebiam tratamento. Não consideraríamos esses números aceitáveis, tal como não o deveríamos fazer com o tratamento das doenças mentais.
Muitas mulheres no pós-parto têm "baby blues". Como é que se distingue entre isso e a depressão pós-parto?
Os "baby blues" são sintomas que a maioria das mulheres experimenta depois do parto. Incluem alterações de humor, sensação de esgotamento, irritabilidade e dificuldade em dormir. Geralmente, os "baby blues" ocorrem pouco depois do parto e duram dias. A pessoa apresenta alguns sintomas de mau humor mas, de um modo geral, sente-se bem.
Os baby blues são bastante diferentes da depressão pós-parto. Os sintomas da depressão pós-parto podem inicialmente assemelhar-se aos dos baby blues, mas são mais intensos e duram mais tempo - pelo menos durante duas semanas ou mesmo meses. Os sintomas específicos incluem humor deprimido contínuo, choro, cansaço excessivo e irritabilidade e raiva intensas.
A mulher pode afastar-se da família e dos amigos, ter menos interesse em atividades de que costumava gostar e até ter dificuldade em criar e cimentar laços com o bebé ou em cuidar dele. A pessoa pode sentir-se sem esperança, sem valor e envergonhada por não ser uma boa mãe. Esta situação pode evoluir para ataques de ansiedade e pânico graves e pensamentos de se magoar a si própria, ao bebé ou a outras pessoas à sua volta.
Existem outros problemas de saúde mental pós-parto?
Sim. A depressão pós-parto é o mais comum dos problemas de saúde mental, mas existem outros.
Outra condição que pode ocorrer por si só ou juntamente com a depressão pós-parto é a ansiedade pós-parto. É normal sentir-se ansioso depois de se tornar um novo pai ou uma nova mãe, mas torna-se um problema quando os sentimentos de ansiedade estão fora de controlo e dominam os pensamentos. Os indivíduos com esta condição têm preocupações que os consomem, incluindo medos irracionais sobre eventos que são improváveis de acontecer.
Outras condições de saúde mental, como a perturbação obsessivo-compulsiva, também conhecida por TOC, podem manifestar-se no período pós-parto. Além disso, o consumo de substâncias está frequentemente associado a diagnósticos de saúde mental.
Uma outra condição que gostaria de mencionar é a psicose pós-parto. Esta é a forma mais grave das condições psiquiátricas pós-parto. É rara, ocorrendo em cerca de uma a duas por cada mil mulheres no período pós-parto. As mulheres podem tornar-se erráticas e alternar entre depressão e euforia, e podem ter alucinações e delírios. Trata-se de uma emergência psiquiátrica que requer cuidados imediatos para evitar que a mulher se prejudique a si própria, ao seu bebé e a outros.
Que tipos de tratamentos estão disponíveis?
Aqui estão as boas notícias. Existe uma variedade de tratamentos eficazes para tratar a depressão pós-parto e outras perturbações da saúde mental.
Os dois tipos de tratamento são a psicoterapia e os medicamentos. A psicoterapia envolve falar sobre as preocupações com um profissional de saúde mental. Existem diferentes tipos de psicoterapias, como a terapia cognitivo-comportamental. Em geral, ajudam os doentes a reconhecer e a lidar melhor com os seus sentimentos.
Os profissionais de saúde também podem prescrever medicamentos antidepressivos. Por vezes, o médico acrescenta um medicamento adicional consoante os sintomas. Por exemplo, as pessoas com ansiedade podem beneficiar também de um medicamento anti-ansiedade.
A Food and Drug Administration dos EUA (organizaçao norte-americana responsável pela regulação e fiscalização de alimentos e medicamentos, sigla original FDA) aprovou dois medicamentos que tratam especificamente a depressão pós-parto. Estes medicamentos são utilizados durante períodos mais curtos do que os antidepressivos e podem ser uma boa opção para algumas mulheres, embora a cobertura do seguro e o custo possam constituir um obstáculo.
Tal como qualquer outra condição médica, algumas mulheres podem responder melhor a uma forma de tratamento do que a outras. Algumas podem necessitar de uma combinação de tratamentos. A duração do tratamento também dependerá das circunstâncias individuais.
O que é que as mulheres grávidas e no pós-parto podem fazer? E como é que as pessoas que as rodeiam podem ajudar a melhorar a sua saúde mental e o seu bem-estar emocional?
A boa saúde durante e após a gravidez começa muito antes da gravidez e do parto. É fundamental que as mulheres - e toda a gente - procurem assistência para problemas de saúde mental. As pessoas com problemas de saúde mental pré-existentes, como a depressão e a perturbação bipolar, têm uma taxa muito mais elevada de problemas de saúde mental no período pós-parto. É importante diagnosticar e tratar estas doenças antes da gravidez.
Dito isto, também é muito importante reconhecer que a depressão pós-parto e outros diagnósticos de saúde mental na gravidez e no pós-parto podem ocorrer em pessoas que não tiveram problemas de saúde mental no passado. Podem ocorrer em qualquer pessoa. Tal como não é "culpa" de ninguém se lhe for diagnosticada diabetes ou cancro, também não é "culpa" de ninguém se tiver um problema de saúde mental. Não deve haver qualquer estigma associado ao diagnóstico.
As pessoas que rodeiam a pessoa podem ajudar, estando atentas a sinais de depressão pós-parto. Podem dar apoio, incluindo encorajar o tratamento e oferecer cuidados infantis e outra assistência de que a pessoa possa necessitar. Todos devem ter em mente que o tratamento imediato é eficaz e crucial para o bem-estar da mulher e da sua família.