Da Casa Pia ao «mundo do crime» - TVI

Da Casa Pia ao «mundo do crime»

Casa Pia

Uma das testemunhas está presa no Brasil. Foi condenado a três anos de prisão, por tráfico de droga

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Ficou conhecido como «André» e é uma das testemunhas do processo da Casa Pia. Hoje, está preso em São Paulo, no Brasil, e deu uma entrevista exclusiva à TVI. Cumpre três anos e seis meses de cadeia por tráfico internacional de droga.

«Foi um erro, uma imaturidade minha», afirma. «Pensei que o facto de ter passado por tudo o que passei... podia fazer o que pensasse. Mas enganei-me e arrependo-me», explica.

«André» foi detido há ano e meio, mas só recentemente se soube que estava preso. O facto foi noticiado por um jornal e referido por um dos arguidos do processo, para mostrar a sua pouca credibilidade enquanto testemunha.

Apesar de preso e a um oceano de distância, «André» soube que Carlos Cruz referiu a sua situação. «Ninguém pode me usar de muleta para tapar um buraco que escavou. Ele engana-se. Eu sofri nas mãos "dessa criatura" desde os meus sete anos até aos 16», acusa.

Revolta é a melhor palavra para descrever o que sente em relação à Casa Pia. «André» chega mesmo a comparar a instituição à cadeia e é muito claro em relação ao que considera pior: «Desde que estou aqui nunca fui agredido por nenhum funcionário. Aqui dentro sinto-me um rei. Sou bem tratado, tenho comida boa. Respeito».

E justifica: «Dentro da instituição nunca tive respeito. Sempre fui olhado como uma criança sem pai, sem mãe, por isso, "vamos fazer o que quisermos"».

Reconhece que o seu exemplo de vida está longe de ser o melhor, mas não sabe explicar: «As pessoas às vezes acham que as crianças mentiram, mas as crianças foram peças usadas e descartadas. Hoje, umas conseguiram suportar e arrumar uma família. Eu, infelizmente, caí num caminho inverso, do mundo do crime».

Admite que o processo da Casa Pia o levou a cometer erros e o que mais lhe custa foi a forma como tratou a única família que tem: uma tia e uns primos. «Fui um monstro, pessoas que só queriam o meu bem... A minha família ia atrás de mim no intuito de me ajudar e eu me revoltei contra todo o mundo. Tornaram-me uma pessoa horrível», lamenta.

Da indemnização que recebeu pelos abusos sofridos ficou a memória. Com uma estranha consciência assume o seu destino: «Gastei. Gastei em várias coisas. Amigos, drogas, bares de prostituição, comprar mota, carro, casa. Hoje não tenho nada. Perdi tudo».

Diz que não acredita na justiça, mas espera que todos sejam condenados. Em relação ao que contou em tribunal «não se arrepende» e «não tira uma vírgula». «Quem tem dinheiro compra a justiça, quem não tem está preso», defende e usa o seu caso como exemplo. Cometeu um crime, «assumiu os seus actos, foi julgado, condenado e está a cumprir a sua pena». Em Portugal, o processo da Casa Pia arrasta-se e «os outros continuam livres».

«André» não sabe se algum dia vai voltar a Portugal: «A minha vontade não era voltar, porque eu sei que vou perder a paciência com "os cara" que fizeram mal. E como, se calhar, a justiça não vai fazer esses "cara" pagar o preço, eu vou acabar a fazer a minha vingança e eu não quero isso para mim», admite.

Quando foi preso carregava 103 bolotas com cocaína no estômago. Bastava uma rebentar para morrer. Confessa ter saudades da tia, sentir-se sozinho no Brasil e do futuro quer algo muito simples: «Quero melhorar a minha vida, encontrar uma pessoa, ser feliz com essa pessoa».
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