Falhadas as negociações com o Governo, os sindicatos de professores arrancam esta terça-feira com uma greve de quatro dias. A paralisação começa hoje nos distritos de Lisboa, Setúbal, Santarém e na Madeira. Termina na sexta-feira com protestos a norte. Na segunda-feira, sindicatos e Governo não conseguiram chegar a acordo sobre o congelamento das carreiras e a contagem do tempo de serviço.
Na segunda-feira, o secretário-geral da Fenprof garantiu à Lusa, que os professores vão “aceitar o desafio” do Governo e fazer greve. Mário Nogueira admitiu que, face ao desenrolar das negociações, a seguir à paralisação os docentes façam “outras coisas”.
Nós tivemos uma expetativa de que o Governo, marcando uma reunião para a véspera do primeiro dia da greve, tivesse alguma coisa de novo para dizer, mas não, marca uma reunião para a véspera da greve e a única coisa que se limita é a dizer o que já tinha dito antes, ou seja, que a maioria do tempo de serviço dos professores é para apagar”, disse à Lusa Mário Nogueira, secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof).
Hoje começa a greve de quatro dias que os professores vão concretizar de forma faseada pelo território nacional, e que tem como grande motivação o desacordo com o Governo em relação à contabilização do tempo de serviço congelado, matéria sobre a qual não saíram avanços ou novidades na reunião de segunda-feira entre as estruturas sindicais e a tutela.
O Governo, representado pela secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, e pela secretária de Estado da Administração e do Emprego Público, Fátima Fonseca, reafirmaram a proposta que já tinha sido apresentada aos sindicatos a 28 de fevereiro e que as estruturas rejeitam: contabilizar apenas cerca de dois anos e 10 meses de tempo de serviço, dos nove anos, quatro meses e dois dias que os professores reclamam.
Dá ideia até de que o Governo o que faz hoje é lançar um desafio aos professores: ‘vão lá fazer greve para eu ver se realmente estão insatisfeitos’. Pois os professores vão aceitar esse desafio e vão fazer greve, e, se calhar, a seguir a essa greve vão fazer outras coisas, porque na verdade esta discriminação é inaceitável”, argumentou Mário Nogueira.
Os sindicatos colocavam algumas expetativas na reunião de segunda-feira para uma eventual desconvocação da paralisação, mas perante os resultados, que não alteraram em nada a proposta inicial, decidiram manter a greve, que arranca hoje nos distritos de Lisboa, Setúbal e Santarém e na região autónoma da Madeira e termina a 16 de março, sexta-feira, dia em que os professores paralisam na região norte (Porto, Braga, Viana do Castelo, Vila Real e Bragança) e na região autónoma dos Açores.
No dia 14 a greve concentra-se na região sul (Évora, Portalegre, Beja e Faro) e no dia 15 na região centro (Coimbra, Viseu, Aveiro, Leiria, Guarda e Castelo Branco).
Se o Governo quer desafios, se o Governo quer confrontos, vamos ao desafio, porque isto não é aceitável. É limpar tempo de serviço para a carreira e é também não querer marcar reuniões para discutir os aspetos da aposentação, dos horários de trabalho, que são outras matérias que vêm de novembro. Isto é completamente inaceitável”, disse Mário Nogueira.
Escolas abertas na Grande Lisboa, mas "ambiente é de recreio"
A greve dos professores está a afetar milhares de alunos da Grande Lisboa, segundo um levantamento da associação de diretores escolares, que encontrou as escolas abertas, mas com “ambiente de recreio e não de aulas”.
Não temos escolas fechadas, mas há muitos professores a fazer greve e escolas a funcionar a meio gás, ou seja, os alunos estão nas escolas, mas não têm todas as aulas”, contou à Lusa Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP).
A greve dos professores começou hoje na região da Grande Lisboa (Lisboa, Setúbal e Santarém) e na Madeira e termina na sexta-feira, dia em que o protesto se deverá fazer sentir na região norte e nos Açores.
A maioria das famílias não sente os efeitos da greve porque os seus filhos estão na escola, embora não tenham todas as aulas. Hoje, o ambiente que se vive nas escolas é mais de recreio e menos de sala de aula. Todos os minutos são de intervalo”, acrescentou Filinto Lima, sublinhando que os professores estão mobilizados para fazer valer a sua posição em relação ao processo de descongelamento do tempo de serviço.
Em causa está o diferendo que separa docentes e tutela na contagem do tempo de serviço que esteve congelado: O Ministério da Educação apenas admite o descongelamento de dois anos e 10 meses e os sindicatos exigem ver contabilizados os nove anos, quatro meses e dois dias congelados.
Para Filinto Lima, os ministérios da Educação e das Finanças devem olhar com atenção para esta greve e para o passado recente dos protestos levados a cabo pelos professores.
“Só este ano letivo já se realizaram mais greves do que desde que o Governo tomou posse e este é um sinal muito importante que o Governo não pode ignorar”, sublinhou.
O professor e representante dos diretores escolares deixa um aviso ao Executivo: “O Ministério das Finanças deve abrir os cordões à bolsa e tratar a Educação de forma diferente”.
“Hoje, há muitas aulas que não estão a ser lecionadas e que acabam por prejudicar milhares de alunos, tendo em conta que cada professor tem, em média, entre 150 a 20 alunos”, afirmou o presidente da ANDAEP, que acredita que nos próximos dias a adesão à greve ainda possa ser mais expressiva.
Escolas com aulas na região Oeste
Várias escolas da região Oeste, no norte do distrito de Lisboa, começaram hoje o dia com aulas e com poucos professores em greve, de acordo com fontes daqueles estabelecimentos contactadas pela agência Lusa.
Na Escola Secundária José Saramago, a maior do concelho de Mafra, com 1.800 alunos, foram poucos os professores que fizeram greve às 08:30 e a maior parte dos alunos estão a ter aulas.
O mesmo se passa nas escolas de terceiro ciclo e secundária Henriques Nogueira e Madeira Torres, em Torres Vedras.
Nota-se alguma adesão à greve, mas não o suficiente para encerrarmos a escola para já”, disse uma fonte da Escola Madeira Torres.
Na Escola Secundária Damião de Góis, em Alenquer, grane parte dos alunos viram as aulas começar às 08:30, havendo apenas poucos docentes em greve.
À semelhança de Alenquer, na Escola Secundária Dr. João Manuel Delgado e na EB2,3 Dr. Afonso Rodrigues Pereira, na Lourinhã, dos 23 professores em serviço às 08:30, apenas um aderiu à greve em cada escola.
Madeira com greve solidária porque na região há entendimento
A greve dos professores na região da Madeira é solidária com as estruturas nacionais, uma vez que o descongelamento das carreiras na região autónoma está “alinhavado”, disse o presidente do Sindicato dos Professores da Madeira (SPM).
É uma greve solidária, mas é mais do que isso porque há outros motivos", explicou Francisco Oliveira, reconhecendo que a recuperação do tempo de serviço é uma questão fundamental nesta paralisação, ainda que desde 13 de dezembro de 2017, o SPM tenha um memorando com a secretaria regional da Educação em que é assumida a recuperação integral do tempo de serviço dos períodos de congelamento para efeitos de progressão na carreira.
Nós temos a questão aqui alinhavada, não está resolvida. Há um compromisso por parte do governo regional de assumir a recuperação desse tempo todo dos períodos de congelamento e entre março e abril esperamos que seja posto no papel a forma como vai ser desenvolvido todo o processo", afirmou.
Francisco Oliveira reconhece que devido a esta questão haverá professores a equacionarem a adesão à greve, mas recordou que numa assembleia geral do SPM, 85% disseram sim, 5% não e 15% abstiveram-se.
Não terá com certeza os números de adesão que tiveram as greves anteriores, mas será fundamental para muitas pessoas", disse.
A 18 de novembro de 2017, depois de uma maratona negocial de 10 horas que se seguiu a longas reuniões em dias anteriores, Governo e sindicatos da educação chegaram a uma declaração de compromisso para dar início em 15 de dezembro às negociações de matérias importantes para os professores como a contabilização do tempo de serviço, a reposição salarial, mas também matérias específicas da carreira que são reivindicações antigas dos sindicatos, como a revisão dos horários de trabalho e a criação de um estatuto de aposentação próprio para os docentes.
Em relação à principal motivação para a greve – a exigência de contabilização integral do tempo de serviço congelado – os sindicatos escudam-se na resolução 01/2018 da Assembleia da República, aprovada com os votos favoráveis das bancadas parlamentares de esquerda, incluindo a do Partido Socialista, e na qual se recomenda a contabilização de todo o tempo de serviço congelado nas carreiras da função pública.
A explicação dada pelo Governo para a proposta que apresenta para a recuperação do tempo na carreira docente é a da “criação de uma lógica de equidade” com as carreiras gerais.
A greve é convocada pelas 10 estruturas sindicais de professores que assinaram a declaração de compromisso com o Governo, entre as quais as duas federações - Federação Nacional de Educação (FNE) e Federação Nacional dos Professores (Fenprof) - e oito organizações mais pequenos: ASPL, Pró-Ordem, SEPLEU, SINAPE, SINDEP, SIPE, SIPPEB E SPLIU.