Jovem «agradeceu» a Passos ter-lhe «chamado ignorante»

Eram nove da manhã em Vila Real e no interior do mercado ainda estava tudo tranquilo, naquela tranquilidade estranha que antecede um rebuliço. Por entre as bancas de frutas e legumes iam-se vendo algumas bandeiras do partido e uns folhetos que a jota foi distribuindo.

Cá fora, Ana de Lurdes discutia com as amigas a situação do país. «Fui sempre apoiante do PS, mas isto agora está tudo tão mau que a gente nem sabe», contou à tvi24.pt, dizendo que ainda não tem o voto decidido. De Passos Coelho, diz que «pode ser uma boa pessoa, mas político, político, acho que não é». O que quer isso dizer? «É uma pessoa meiga, com vontade talvez de fazer, mas não vai conseguir».



Mal acabámos de falar com Ana de Lurdes, acabou-se o sossego no Mercado de Vila Real. Chegou Passos Coelho, «o menino da terra», como uma apoiante lhe chamou, e todos queriam tocar, cumprimentar. Por entre beijinhos, abraços, cumprimentos e muitos empurrões no corredores estreitos do mercado, o líder do PSD passou pelas primeiras bancas do mercado. A confusão era tanta que por pouco alguns não caíram dentro de uma caixa de batatas¿

A jogar em casa, Passos Coelho falou com todos os que conseguiram furar para se abeirar dele. Encontrou duas colegas de liceu, alguns familiares, pais de amigos, conhecidos. E encontrou até quem lhe desse alguns conselhos: «Não se meta com os outros. Os outros são os outros e o senhor é o senhor. E tenha juizinho», disse-lhe uma mulher, referindo-se à «troca de acusações» entre o líder do PSD e o secretário-geral do PSD. «Não se estrague», disse-lhe outra, poucas bancas à frente.

Mas foram muitos os que lhe pediram para tirar Sócrates, «esse mentiroso», do Governo. «Ele fez muito mal aos professores», disse a Passos uma docente com os olhos mareados de lágrimas.

Houve muitos elogios, muitos pedidos de «mudança», mas nem tudo foram elogios rosas, ou, neste caso, laranjas, nesta passagem do líder do PSD pelo mercado de Vila Real. Uma jovem abeirou-se dele dizendo que lhe queria agradecer uma coisa. Percebeu-se depois que o «agradecer» era dito em tom de ironia. «Queria só agradecer-lhe ter-me chamado ignorante. Estou a frequentar um curso EFA (Novas Oportunidades) e sou a melhor aluna da minha turma», disse, em resposta às declarações polémicas do líder do PSD que classificou o programa Novas Oportunidades como «uma credenciação à ignorância».

Passos Coelho foi surpreendido e demorou alguns segundos até perceber do que se tratava. «Num curso EFA?», questionou. «No Centro de Novas Oportunidades», disse depois, já em tom condescendente, enquanto a jovem voltava a agradecer, em seu nome e no dos restantes colegas de turma, terem-lhes chamado «ignorante». «Eu não lhe chamei», tentou ainda dizer Passos Coelho, mas depois desistiu e afirmou apenas, com alguma indisfarçável ironia: «Espero que o seu curso lhe sirva para muito. Espero que sim».

Passos continuou a volta ao mercado, seguido pela jota que, aos gritos e com ajuda de um megafone, pedia maioria absoluta e depois saiu, e, ao som dos bombo foi distribuindo algumas flores laranja às senhoras que iam passando. «Conheço-o desde pequenino. Era tão bonito», disse-lhe uma. «Ainda é», acrescentou outra. Piropos aliás repetidos durante toda a campanha.